domingo, 31 de julho de 2016

A PARÁBOLA DA FIGUEIRA ESTÉRIL

Jesus usou muito o recurso de parábolas - pequenas estórias que passavam ensinamento moral. Nenhuma pessoa da Bíblia usou tanto esse recurso como Jesus - as parábolas são como uma marca registrada do ministério d´Ele.

Uma das parábolas de que mais gosto, embora não seja tão popular como a do "bom samaritano" ou a do "filho pródigo", é a da "figueira estéril". Vamos ver o que Jesus disse:
Então contou esta parábola: "Um homem tinha uma figueira plantada em sua vinha. Foi procurar fruto nela, e não achou nenhum. Por isso disse ao que cuidava da vinha: "Já faz três anos que venho procurar fruto nesta figueira e não acho. Corte-a! Por que deixá-la inutilizar a terra?" Respondeu o homem: "Senhor, deixe-a por mais um ano, e eu cavarei ao redor dela e a adubarei. Se der fruto no ano que vem, muito bem! Se não, corte-a". Lucas capítulo 13, versículos 6 a 9 
Na Palestina, no tempo de Jesus, era costume plantar árvores frutíferas em meio ao vinhedo.. A árvore frutífera era deixada à própria conta por cerca de três anos e a partir daí, era exigido dela resultados, frutos comestíveis. 

No caso da figueira da parábola, os frutos vinham sendo procurados há três anos, logo a árvore já tinha seis anos de vida. E ainda assim, não apresentava resultados. A figueira parecia ser estéril.

Ora, a figueira suga muitos nutrientes da terra se manter e não fazia sentido conservar uma árvore estéril. Sua permanência em meio à plantação atrapalhava mais do que ajudava. Por isso o dono da terra decidiu cortar a figueira.

Mas o responsável pela vinha, o agricultor, pediu ao dono da terra mais um ano de prazo. Prometeu adubar a figueira e dar a ela tratamento especial. Se depois desse prazo adicional, a figueira não desse frutos, não apresentasse resultados, aí sim seria cortada.

O agricultor devia ter um carinho especial por aquela planta para propor uma medida tão excepcional - não era costume adubar figueiras naquela época (há qualquer registro desse tipo de prática no Velho Testamento). Na verdade, o agricultor queria desesperadamente salvar aquela árvore.

O que isso tudo quer dizer? Primeiro, a vinha é o povo de Deus (Israel) - essa imagem é muito comum no Velho Testamento como, por exemplo, em Isaías capítulo 5, versículo 7.

E certamente assim a vinha foi entendida pelos ouvintes de Jesus. A figueira em meio a ela era parte da plantação, portanto, representava uma pessoa pertencente ao mesmo povo. Mas essa pessoa não tinha boas obras para mostrar, era estéril.

Trazendo para os dias de hoje, quando entendemos o povo de Deus como sendo a Igreja Cristã, a figueira estéril representa uma pessoa que se diz cristã e até frequenta uma comunidade de fé, mas não colabora para a obra de Deus: não ajuda quem sofre, nem testemunha a Palavra, não ora com fé por quem precisa, não louva como deveria, etc. A fé dessa pessoa está morta, pois não tem obras para mostrar (Tiago capítulo 2, versículos 17 e 18). 

Deus (o dono da plantação, na parábola) diz que aquela pessoa de nada serve, pois nada produz, embora exija atenção e cuidado do Espírito Santo (o agricultor) e daqueles(as) que o ajudam a tomar conta do povo. 

É justamente o agricultor que pede a Deus mais uma chance para a figueira: vai fazer um último esforço para que a planta dê frutos. E Deus concede pois é misericordioso. A pessoa que se diz cristã mas nada fez pela obra, embora exija cuidados e atenção, vai ter uma última oportunidade para mudar sua postura. 

Mas essa será sua última oportunidade: se não mudar, se não entregar verdadeiramente a Jesus, vai ser tirada do meio do povo de Deus. Não haverá outra oportunidade. Simples assim.

E o tempo da pessoa acabará quando o dono da vinha voltar, o que, para nós, significa a segunda vinda de Jesus Cristo, quando todos os seres humanos serão julgados.

Há muitas parábolas onde Jesus ensinou a mesma coisa: a porta que é fechada, deixando alguns convidados da festa de fora; ou as virgens que não tinham óleo para suas lâmpadas e chegaram tarde ao casamento.

Jesus vai voltar, no final dos tempos e quem não tiver obras para mostrar, não terá como testemunhar sua fé. E sem fé, não há salvação possível: a pessoa simplesmente será tirada do meio do povo de Deus (os salvos). 

Portanto, cada um de nós, deve ter a preocupação de dar frutos. De se mostrar uma árvore frutífera em meio à plantação de Deus.

Com carinho

sexta-feira, 29 de julho de 2016

A DIFÍCIL TAREFA DE PROTEGER OS JOVENS DOS MALES DO MUNDO

Eu lhes tenho dado a tua palavra, e o mundo os odiou, porque eles não são do mundo, como também eu não sou. Não peço que os tires do mundo, e sim que os guardes do mal. João capítulo 17, versículos 14 e 15

Um dos grandes desafios das famílias e comunidades cristãs é a proteção dos seus jovens que, afinal, vivem num mundo hostil aos valores cristãos. Não queremos que eles(as) sejam expostos(as) à promiscuidade sexual, ao uso de drogas recreacionais, à violência e a outras outras práticas negativas, das quais nossa sociedade está cheia. E, sobretudo, queremos que mantenham sua fé em Cristo.

Vejo amigos queridos enfrentando esse desafio e se questionando quanto à forma certa de proceder - eu já cumpri minha missão nessa área, pois meus dois filhos já tem bem mais do que trinta anos. 

As atitudes que tenho visto por aí costumam oscilar entre dois extremos, ambos errados a meu ver: um por fazer muito pouco e outro por fazer demais.

Os pais que erram por fazer muito pouco são aqueles que defendem a tese ser preciso respeitar a individualidade dos(as) jovens, deixando-os(as) escolher livremente. Deve-se ensinar os bons princípios de vida e da fé cristã e depois deixar que escolham livremente seus próprios caminhos, pois esse é um direito deles(as). 

O erro dessa abordagem está na falta de conhecimento da natureza real do ser humano. Esses pais pensam que ela é essencialmente boa e, se ensinados os princípios certos, plantada a boa semente, os(as) jovens vão acabar se encaminhando na direção certa e fazendo aquilo que agrada a Deus. Podem até tropeçar aqui e ali, coisa bem natural, mas vão chegar em porto seguro.

Mas não é bem isso que a experiência prática mostra: basta ver o estado de injustiça, corrupção e violência da nossa sociedade - ela encarna perfeitamente o ensinamento bíblico que "o mundo jaz no Maligno" (1 João capítulo 5, versículo 19). 

E tanto isso é verdade que Deus não age conosco dessa forma - Ele bem sabe que, deixados por nossa própria conta, não faríamos as escolhas certas. É exatamente por isso que o Espírito Santo foi escalado para ter o papel de incomodar e influenciar cada pessoa, levando-a na direção certa.

Deus nunca nos deixa por nossa própria conta, embora respeitando nosso direito de fazer escolhas, nosso livre arbítrio, que aliás foi nos dado por Ele mesmo. 

Agir de menos pode até ser confortável, pois evita um monte de atritos com os(as) jovens, que são pela própria natureza rebeldes e contestadores, mas nunca é a coisa certa a fazer. 

A outra abordagem parte para o extremo oposto: tenta proteger os(as) jovens criando uma "bolha" em torno das suas vidas. Eles(as) são como que tirados(as) do mundo, na tentativa de eliminar tentações, influências nocivas e perigos.

Aí os(as) jovens cristãos(ãs) são incentivados(as) a construir toda sua vida social dentro das próprias igreja, somente frequentando eventos evangélicos, só ouvindo música gospel e forçosamente buscando os(as) namorados(as) ali.

Vejo dois problemas nessa abordagem. O primeiro deles está embasado na própria oração que abre este post: ela foi feita por Jesus no final da sua vida na terra, quando pediu a Deus que protegesse seus discípulos(as), que estavam ficando para trás (Jesus ia voltar para o Pai).

Agora, repare bem no que Jesus disse no texto citado acima: não pediu a Deus para tirar seus discípulos(as) do mundo, para isolá-los(as) numa "bolha" protetora. E isso está muito claro. 

Jesus não pediu isso por uma razão muito simples: em outro momento Ele tinha nos dado o mandamento para sermos o "sal da terra" (Mateus capítulo 5, versículo 13), isto é somos chamados para fazermos a diferença na sociedade e não podemos fazer isso isolados(as), protegidos(as) numa "bolha", separados da sociedade. Simples assim.

Viver no meio do mundo que nos cerca implica obviamente correr o risco de sermos impactados pelas tentações e más influências da sociedade. E não há como fugir disso e isso também vale para os(as) jovens.

É claro que antes de serem expostos a tal tipo de risco, eles(as) precisam ter adquirido certo grau de maturidade emocional e espiritual, já tendo sido esclarecidos(as) sobre os caminhos de Deus. Assim, o grau de exposição permitido para um jovem de quinze anos evidentemente precisará ser menor do que o risco permitido para alguém com vinte anos. Para cada faixa de idade há limites de grau de exposição e risco a serem respeitados.

A outra razão que concorre para tornar a tese da "bolha protetora" ruim é o fato dessa proteção não poder ser mantida por toda a vida dos(as) jovens. Mais cedo ou mais tarde, as exigências da vida prática vão se impor, como a necessidade de trabalhar ou de estudar longe de casa, e eliminar tal tipo de proteção. E quando isso acontece os(as) até então mantidos(as) numa "bolha" estarão totalmente despreparados(as) para os desafios da vida, podendo inclusive entrar numa crise - já vi isso acontecer.

Portanto, não se deve tentar proteger demais os(as) jovens. Essa também não é uma boa opção.

A abordagem certa é ir ensinando os(as) jovens o que precisam saber e ir aos poucos permitindo sua exposição aos riscos da vida. Dosando esses riscos, mas não impedindo os(as) jovens de vivê-los. 

Dito assim, até parece tarefa fácil o fazer o que é certo, mas não é.

Essa calibragem precisa não é coisa trivial. Deixar por um lado que nossos(as) jovens vivam a realidade, e corram os riscos com ela relacionados, ao mesmo tempo dando-lhes condição de funcionarem de fato como o "sal da terra".

O segredo, penso eu, está em deixá-los(as) viver no mundo mas ensiná-los a não fazer concessões que descaracterizem seu chamado para uma vida verdadeiramente cristã. Ensiná-los a dizer não quando for necessário, sem preocupação de parecer careta. Mostrar que viver no mundo não precisa significar fazer tudo aquilo que o mundo espera que façam.

Com carinho

quarta-feira, 27 de julho de 2016

O SALMO 23

O SENHOR é o meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam. Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do Senhor por longos dias. Salmo 23

Este é o mais conhecido e querido dos salmos - todo mundo lembra do primeiro versículo: "o Senhor é meu pastor e nada me faltará..." 

Essa poesia foi composta por Davi quando ele já estava na corte de Saul, depois de matar o gigante Golias. Nesse texto ele refletiu sobre sua vida anterior, feliz e sem complicações, quando era um simples pastor.

Nele, Davi deu uma aula do que deve ser a fé simples, talvez até mesmo ingênua. Uma fé como a das crianças, que Jesus apontou como o tipo de fé mais verdadeira (Marcos capítulo 10, versículos 13 a 16).

Vamos analisar o que Davi quis dizer no salmo 23, verso por verso. O autor começa chamando Deus de "meu pastor" e isso é inesperado, considerando a tradição das pessoas do povo de Israel, que somente se dirigiam a Ele de maneira bem formal.

Davi fez algo diferente: comparou Deus com um pastor de ovelhas que cuida do seu rebanho de animais indefesos.

Jesus se referiu a si mesmo como o "bom pastor, que dá a vida pelas suas ovelhas" (João capítulo 10, versículo 11), uma referência direta ao salmo 23. Ou seja, Jesus sancionou aquilo que Davi tinha escrito quase mil anos antes: Deus é de fato nosso pastor. Aquele que cuida de nós.

E quem tem Deus como Pastor pode descansar de fato pois Ele não deixará que falte nada verdadeiramente importante Há aqui outro paralelo com aquilo que Jesus falou: não devemos nos preocupar com as coisas mundanas, lembrando sempre dos lírios do campo e dos pássaros, sempre cuidados pelo Pai (Mateus capítulo 6, versículo 25).

A frase "...deitar-me faz em verdes pastos..." faz referencia a uma condição das ovelhas: não são capazes de saber, por si próprias, se já comeram o suficiente - são animais muito estúpidos. Era preciso que o pastor se aproximasse de cada uma, toca-se nela com o cajado, para chamar sua atenção, e mandá-la parar de comer e deitar-se.

E assim também é conosco: nunca sabemos o que devemos de fato fazer - se precisamos nos aquietar, se já temos o suficiente, etc. Precisamos da orientação adequada do Espírito Santo. 

O pastor levava as ovelhas para beber água num lugar tranquilo, normalmente um pequeno riacho ou um poço. E a frase "guia-me mansamente a águas tranquilas..." reflete essa situação, mas também aponta para Jesus: Ele disse que quem tiver sede espiritual deve beber da água viva que flui d´Ele (João capítulo 7, versículo 37). E essa sede nunca mais voltará.

O versículo seguinte fala em "refrigerar a alma", embora a melhor tradução seja "restaurar a alma". E é exatamente isso que acontece com aquele(a) que segue a Jesus: alimentado e com a sede saciada, a pessoa tem seu espírito restaurado. 

As "veredas da justiça" são os caminhos seguros, onde as ovelhas não ficavam com as patas presas em raízes, não tropeçavam em pedras soltas, não caiam em fendas disfarçadas. São esses os caminhos por onde o Espírito Santo leva aqueles(as) que seguem Jesus.

Continuando nossa análise, era parte do trabalho do pastor naquela época vender a lã que suas ovelhas produziam - era daí que tirava seu ganho. O bom pastor construía para si um nome confiável - as pessoas compravam dele sem qualquer dúvida, sem nem precisar olhar para as ovelhas para verificar o tipo de lã produzida. O pastor era o "selo de segurança" dos compradores e não as ovelhas. 

A mesma coisa acontece com Jesus: Ele gera confiança mesmo em quem não é cristão(ã). E é por causa disso que a sociedade espera de nós, cristãos(ãs), que venhamos a produzir boa "lã" (bons frutos), compatível com a confiabilidade do pastor.

Ás vezes, em busca de novas pastagens, os rebanhos de ovelhas precisam ser conduzidos por caminhos estreitos, difíceis, onde um passo em falso podia levar a um acidente terrível. As ovelhas confiavam que o pastor iria levá-las em segurança, que não iam sofrer nenhum mal. Esse é o significado da frase: "...ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo..." 

A frase "...tua vara e o teu cajado me consolam..." aponta para outra tarefa do pastor: circular pelo rebanho e chamar cada ovelha pelo nome, dando-lhe uma pequena batida com o cajado. Assim, ele demonstrava um relacionamento pessoal com cada animal.

E assim também é conosco: o Espírito Santo entra em contacto com cada um(a) de nós, orientando, consolando e nos fazendo sentir amados pelo Pai.

As principais inimigas de uma ovelha, depois dos predadores (como os lobos), são as outras ovelhas. Quando uma delas está ferida, as demais invadem seu espaço vital e a impedem de comer e ela acaba morrendo de fome. Cabe ao pastor impedir que isso aconteça e esse é o significado da frase "...preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos..."

E isso também tem um paralelo perfeito com a vida atual: frequentemente os(as) cristãos(ãs) são os(as) maiores inimigos(as) de quem está caído, pois julgam e condenam essa pessoa, fazem fofoca dela, etc. Exatamente com as ovelhas.

Os ferimentos das ovelhas eram cuidados com óleo de oliva que ajudava na cicatrização. O mesmo óleo, depois de consagrado, era utilizado para ungir os reis de Israel. Agora, na expressão "unges a minha cabeça com óleo" há uma referência ainda mais importante: Davi tinha sido ungido futuro rei de Israel, quando tinha cerca de dezesseis anos, pelo profeta Samuel, embora, quando escreveu o salmo 23, ainda não tinha assumido o trono.

O cálice das ovelhas era uma pedra escovada, com dimensões aproximadas de 1,20 m x 0,50 m, onde o pastor colocava água. Como essa pedra ficava exposta ao sol, o pastor a enchia de água até transbordar para resfriá-la, dando mais conforto às ovelhas. Portanto, a expressão "o meu cálice transborda" aponta para esse gesto de carinho do bom pastor.

E é assim que Deus age conosco: nos dá da sua graça até que transbordemos e possamos viver em paz. 

A bondade e a misericórdia do pastor acompanhava as ovelhas enquanto elas viviam. O pastor tinha amor por cada uma delas e as tratava como seres queridos. E o mesmo podemos esperar de Deus.

Chegamos então à última frase do salmo: "...e habitarei na casa do Senhor para todo o sempre..." Nela está resumida nossa esperança: estar com Deus para todo o sempre. Essa é promessa que acompanha a salvação proporcionada por Jesus.

Davi, no texto do salmo 23, aponta para essa realidade última - ele conhecia essa promessa e acreditava nela. 

Com carinho

segunda-feira, 25 de julho de 2016

A PARÁBOLA DOS TRABALHADORES BOIA FRIA

Porque o reino dos céus é semelhante a um homem, pai de família, que saiu de madrugada a contratar trabalhadores para a sua vinha. E, ajustando com os trabalhadores a um dinheiro por dia, mandou-os para a sua vinha. E, saindo perto da hora terceira, viu outros que estavam ociosos na praça, e disse-lhes: Ide vós também para a vinha, e dar-vos-ei o que for justo. E eles foram. Saindo outra vez, perto da hora sexta e nona, fez o mesmo. E, saindo perto da hora undécima, encontrou outros... Diz-lhes ele: Ide vós também para a vinha... E, aproximando-se a noite, diz o senhor da vinha ao seu mordomo: Chama os trabalhadores, e paga-lhes....Vindo, porém, os primeiros, cuidaram que haviam de receber mais; mas do mesmo modo receberam um dinheiro cada um. E, recebendo-o, murmuravam contra o pai de família, dizendo: Estes derradeiros trabalharam só uma hora, e tu os igualaste conosco, que suportamos a fadiga e a calma do dia. Mas ele, respondendo, disse a um deles: Amigo, não te faço agravo; não ajustaste tu comigo um dinheiro? Toma o que é teu, e retira-te; eu quero dar a este derradeiro tanto como a ti. Ou não me é lícito fazer o que quiser do que é meu? Mateus capítulo 20, versículos 1 a 15

Essa parábola de Jesus é muito importante por que toca num aspecto fundamental da salvação: ela não é por mérito e sim pela Graça de Deus, mediante o sacrifício de seu Filho na cruz. E isso tem importantes consequências que costumam escapar ao entendimento das pessoas.



A estória fala de um dono de vinha que contratou trabalhadores avulsos - o equivalente aos nossos "boias frias" - para trabalhar. Contratou os primeiros no início da jornada de trabalho e prometeu-lhes pagar determinada quantia justa. Mas ao ver que a primeira leva não tinha sido suficiente, foi contratando outros trabalhadores ao longo do dia, prometendo-lhes o mesmo valor pela jornada, embora fossem trabalhar menos horas. 

Ao final do dia, deu a todos os trabalhadores o prometido: a mesma quantia. Aí os trabalhadores que tinham sido contratados no início da jornada reclamaram porque tinham trabalhado mais horas e ainda assim recebido a mesma coisa, o que lhes pareceu injusto.

O dono da vinha respondeu que combinou com cada um a quantia a ser paga e fez exatamente como o combinado. E como o dinheiro era dele, podia pagar o que bem desejasse a cada trabalhador e ninguém podia reclamar porque cumprira o prometido.

Nessa parábola , assim como em todas que Jesus contou, o dono da vinha representa Deus. E a vinha o seu povo (Isaías capítulo 5, versículo 7).

Os trabalhadores são aqueles(as) que fazem a obra de Deus. Algumas dessas pessoas se convertem cedo nas suas vidas e têm oportunidade de trabalhar por muitos anos nessa obra. Outras se convertem mais tarde, quase ao fim da sua vida na terra - são os trabalhadores contratados quase ao final da jornada de trabalho.

Há muitos exemplos na Bíblia de pessoas com trajetórias espirituais diferentes nas suas vidas. Por exemplo, o apóstolo Paulo trabalhou décadas pela obra de Deus, fazendo diversas viagens missionárias, pastoreando inúmeras igrejas, sofrendo perseguições, etc.

O ladrão que foi crucificado ao lado de Jesus não fez nada pela obra de Deus, pois se converteu poucas horas antes de morrer. E mesmo assim foi salvo (Lucas capítulo 23, versículo 43) - recebeu de Deus a mesma graça reservada para Paulo.

O apóstolo, assim como todos os(as) demais como ele, é representado na parábola pelo trabalhador contratado no começo do dia de trabalho e o o ladrão na cruz, e outros(as) como ele, pelo trabalhador contratado ao final do dia. Uns trabalharam bem mais do que os outros, mas todos receberam do dono da vinha o mesmo "salário" (a salvação).

Isso parece justo? muita gente pensa que não. Mas elas não estão certas em criticar Deus. Afinal, ninguém é salvo pelo que faz e sim pelo que acredita (a fé em Jesus como seu Salvador). Logo, não faz diferença, para fins de salvação, se essa fé chegou no começo da vida ou ao final dela - a situação perante Deus continua a mesma.

E como as pessoas são salvas pela Graça de Deus e não pelo mérito individual delas, ninguém pode questionar Deus pelo que faz. Por justiça, todos deveriam ir para o inferno e somente a Graça de Deus nos oferece um outro caminho.

É esse o significado da frase final do dono da vinda (Deus) na parábola: Ele podia fazer o que desejasse com seu dinheiro. Em outras palavras, Deus pode fazer o que desejar com sua Graça, pois Ele nos dela sem nada pedir em troca. É um presente.

O dono da vinha podia ter contratado outros trabalhadores, mas escolheu contratar aqueles e prometeu-lhes um salário que pagou - foi absolutamente correto e justo. Nenhum trabalhador tinha o direito de olhar para o lado e tentar fazer comparação com a situação dos demais.

A salvação funciona exatamente assim: Deus fez uma promessa aos seres humanos - que aceitar Jesus como Salvador, será salvo(a). E vai cumpri-la no final dos tempos.

Portanto, não cabe a ninguém ficar olhando para o lado e avaliando se outras pessoas merecem receber a mesma salvação. Ninguém é "porteiro" do Paraíso. Simples assim.

Há ainda uma coisa importante a comentar em relação a essa parábola: embora todos(as) recebam a mesma salvação pela Graça de Deus, há sim prêmios, que vão além dela, que têm a ver com as obras: quem tiver feito mais pela obra de Deus, receberá prêmio maior. Esses prêmios são chamados "galardões" e se você quiser saber mais a respeito disso, leia o post que escrevi a respeito (veja mais).

Com carinho

sábado, 23 de julho de 2016

O SERMÃO DA MONTANHA

Leia Mateus capítulos 5 a 7 
O "Sermão da Montanha" é a pregação mais longa de Jesus registrada na Bíblia. Uma das coisas mais interessantes que essa pregação não ensina aquilo que devemos crer - Jesus fez isso em outros momentos - e sim o que devemos fazer:
Portanto, quem ouve estas minhas palavras e as pratica é como um homem prudente que construiu a sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, e ela não caiu, porque tinha seus alicerces na rocha. Mas quem ouve estas minhas palavras e não as pratica é como um insensato que construiu a sua casa sobre a areia. Caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram contra aquela casa, e ela caiu. E foi grande a sua queda. Mateus capítulo 7, versículos 24 a 27

O ensinamento está claro: o Sermão da Montanha ensina a conduta cristã correta. O que precisa ser feito por nós. Foi por isso que Santo Agostinho, um dos maiores teólogos do cristianismo, disse que esse Sermão é o "programa perfeito para seguir uma vida cristã". Por isso quem ouve e pratica aquilo que Jesus ensinou constrói sua vida espiritual sobre base sólida (rocha). Quem não dá bola, pode até pensar que está bem, mas não é essa a realidade - sua "construção " espiritual está apoiada sobre areia.

É interessante observar, comparando com o mundo de hoje, repleto de grandes igrejas e catedrais luxuosas, que Jesus não tinha onde pregar. Ele falava onde era possível. Nesse caso, Jesus subiu num monte da Galileia, para ficar numa posição onde todos (as) pudessem vê-lo e dali falou para o povo. 

Essa situação nos ensina que Deus não tem lugares preferidos para se fazer ouvir. Ele está em qualquer lugar e se manifesta onde e como deseja. Não é pode ser ouvido apenas em templos ou em outros lugares especialmente consagrados a Ele.

Outra coisa interessante a observar é que Jesus falou sentado. Na tradição judaica, isso significava que estava falando na condição de Professor da Lei (a Bíblia Hebraica, o nosso Velho Testamento). Era um momento solene, portanto..

As famosas "bem-aventuranças" estão contidas nesse sermão. São pequenos provérbios com dois objetivos em mente. Primeiro, indicar quem são os(as) verdadeiros(as) bem-aventurados(as), ou seja que alcançaram a verdadeira alegria e são vistos(as) com favor por Deus. Depois, ensinar sobre a verdadeira alegria.

Jesus, quando falou sobre essas coisas, foi contra toda a sabedoria da época - Ele inovou de forma maravilhosa. Os costumes judeus ensinavam que os sinais exteriores de prosperidade apontavam para bençãos de Deus. Em outras palavras, os(as) abençoados(as) por Deus eram prósperos(as), estavam bem de vida, tinham saúde, etc. Assim, quem demonstrava passar por dificuldades físicas e/ou materiais certamente estava em pecado. 

Ora, essa era uma filosofia cruel - além de passar pelo problema em si, a pessoa ainda tinha que enfrentar a desconfiança geral por conta do possível pecado que seria a raiz do seu sofrimento.

Jesus falou exatamente o contrário: são felizes aqueles(as) que sofrem, choram, passam por lutas, são perseguidos, etc. Essas são as pessoas que verão a Deus e que herdarão seu Reino.

Jesus ainda ensinou no mesmo Sermão que todos(as) os cristãos(ãs) têm obrigação de testemunhar sobre sua fé - devemos ser como o sal que dá gosto à comida. Para isso, vivendo no meio da sociedade, devemos dar o exemplo e contribuir para melhorar as coisas. Devemos também ser como a luz para quem está próximo(a) e anda no escuro, refletindo a luz que vem de Jesus.

O Sermão da Montanha também fala bastante sobre a oração. Jesus ensinou que precisamos orar com fé para pedir e conseguir as coisas de Deus. A oração deve sempre ser feita em atitude humilde, com discrição e em atitude respeitosa - ao contrário do que acontece hoje em muitas igrejas onde as pessoas gritam, se jogam no chão, etc.

Jesus mostrou ainda como orar através da famosa oração do Pai Nosso. Ali estão os passos a serem dados: invocação do Pai, adoração a Deus, os pedidos e a finalização. Mostrou quais pedidos a Deus devem ser feitos: atendimento das necessidades diárias, perdão para nossos pecados, proteção contra as tentações e o mal. 

Jesus falou ainda sobre o perdão: precisamos perdoar se queremos ser perdoados por Deus. Simples assim. E a disposição para o perdão deve ser sem limites (até "setenta vezes sete") e abranger não somente quem amamos mas também inimigos(as).

Recomendo que você leia com cuidado e reflita sobre o Sermão da Montanha. Tenho certeza que você quer ter uma vida espiritual sólida, firmada sobre a rocha que é Deus. E nesse ensinamento de Jesus está contido tudo que você precisa saber a respeito

Com carinho

quinta-feira, 21 de julho de 2016

A MULTIPLICAÇÃO DOS PÃES E PEIXES

Mateus capítulo 14, versículos 13 a 21; Marcos capítulo 6, versículos 30 a 44; Lucas capítulo 9, versículos 10 a 17; e João capítulo 6, versículos 1 a 14
Este milagre de Jesus foi muito importante, tanto assim, que se trata de uma das poucas coisas que aconteceram com Ele registradas pelos quatro Evangelhos.

Milagres não são apenas manifestações do poder de Deus, contrariando as leis da natureza. Fazendo o que parece impossível. São muito mais: trata-se de sinais e do testemunho da presença e da obra de Deus entre nós. 

Deus opera milagres em prol do avanço do Reino de Deus. Portanto, milagres, pela sua própria definição, não são coisas que acontecem todo dia. Por qualquer razão. A qualquer hora. Milagres são coisas muito especiais.

No caso do milagre da multiplicação dos pais e peixes, Jesus foi para nordeste do Mar (Lago) da Galileia, numa jornada de cerca de 8 km, e foi seguido por uma multidão de 5 mil homens e muitas mulheres e crianças. 

Quando Jesus tinha terminado de falar, as pessoas perceberam estar com fome e não havia o que dar para elas. Ora, seria preciso cerca de 200 denários (mais ou menos 8 meses de salário de um operário) para comprar comida para todo mundo que estava ali. 

As pessoas presentes somente tinham cinco pães de cevada e dois pequenos peixes. E mesmo assim Jesus conseguiu alimentar todo mundo - Ele multiplicou aqueles poucos alimentos de forma maravilhosa. 

Há muitos ensinamentos a tirar desse ato. O primeiro deles é que Jesus realmente é o pão da vida (João capítulo 8, versículos 48 a 51). O alimento para nossa vida espiritual. 

Há também uma forte correlação entre o que Jesus fez ali e a Santa Ceia, quando falou para os discípulos que o pão representava seu corpo e o vinho o seu sangue (Lucas capítulo capítulo 22, versículos 19 e 20 e 1 Coríntios capítulo 11, versículos 23 a 29).) 

Outro ensinamento importante é que Deus usa coisas simples para fazer seus maiores milagres: uma simples vara foi usada por Moisés para abrir o mar Vermelho; Davi usou uma pequena pedra, tirada de um riacho, para matar o gigante Golias; e Eliseu usou um punhado de farinha e um pouco de azeite para alimentar uma família. 

Sempre me impressiono com o fato que Deus faz coisas maravilhosas com estrema singeleza, sem grandiosidade, sem fogos de artifício, sem cenários luxuosos. Tanto assim, que foi num sala com decoração pobre, no segundo andar de um prédio qualquer, que Jesus conduziu uma ceia com seus discípulos, onde serviu pão e vinho. E com esses gestos simples, mudou a história da humanidade. 

Jesus alimentou uma enorme multidão com um pequena quantidade de alimentos, que mal daria para dois adultos. E assim ensinou que podemos confiar n´Ele para atender nossas necessidades, tanto físicas quanto espirituais. e também para saciar nossa fome e sede por justiça, compreensão e amor. Simples assim. 

Com carinho

terça-feira, 19 de julho de 2016

VOCÊ JÁ OUVIU FALAR NO PENTATEUCO

Pentateuco é simplesmente o conjunto formado pelos cinco primeiros livros do Velho Testamento: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Essa é a parte da Bíblia mais importante para os judeus, sendo chamada por eles de Torah, ou a Lei.

A autoria desse conjunto de textos é tradicionalmente atribuída Moisés, conforme registrado em Êxodo capítulo 17, versículo 4 e Números capítulo 33, versículos 1 e 2. Agora, lendo os textos com cuidado, é fácil de ver que eles passaram pelas mãos de outros autores, que provavelmente editaram o conteúdo inicial e acrescentaram algum material, como é o caso do relato da morte de Moisés no final do Deuteronômio.

Agora, o fato dos textos originais de Moisés terem sofrido acréscimos em nada diminui a importância do Pentateuco, pois se acreditamos que o Espírito Santo inspirou Moisés a escrever, a mesma inspiração pode ter vindo para esses outros autores, que deram a forma final ao material. 

Há muita discussão sobre quantos autores participaram do texto final, além de Moisés. Alguns estudiosos, pelo estilo de escrita, identificam até quatro autores adicionais, que costumam ser apelidados de Javista (por se referir a Deus como Iaveh), Eloista (por se referir a Deus como Elohim), Sacerdote (pela preocupação com as leis) e o Deuteronomista (que teria editado o último livro do Pentateuco). 

Esses estudiosos argumentam que a existência de relatos repetidos no Pentateuco - por exemplo, os Dez Mandamento aparecem no Êxodo capítulo 20, versículos 1 a 17 e Deuteronômio capítulo 5, versículos 1 a 21 - comprovam essa última autoria. Com efeito, leia os dois textos sobre os Dez Mandamentos que você vai perceber claramente a diferença de estilo - não há diferenças no conteúdo dos dois relatos, mas claramente eles foram escritos por mãos diferentes.

O livro do Gênesis fala do início das coisas. Começa com a criação do universo e da vida, inclusive dos seres humanos. Depois, fala sobre o início da história do povo de Deus, começando por Adão e Eva, continuando por Noé, até chegar às quatro gerações da família de Abraão. É nesse livro onde aparece o relato da Aliança que Deus fez com Abraão e notamos as primeira referencias ao Messias (Jesus).

Êxodo fala sobre a formação do povo de Israel, começando com o relato da sua libertação do cativeiro do Egito. A família de Jacó, neto de Abraão, tinha migrado para aquele país por causa da fome em Canaã (Palestina), território onde viviam, conforme o relato do final do Gênesis.

Essa família se multiplicou e acabou gerando um povo, Israel. Em dado momento esse povo foi escravizado para ser usado como mão de obra barata na construção das grandes obras dos faraós. Depois de mais de quatrocentos anos de cativeiro, Deus mandou Moisés libertar o povo e conduzi-lo de volta a Canaã (a Terra Prometida).

É no Êxodo que estão contadas as dez pragas que o povo egípcio sofreu, sendo forçado a libertar os escravos, a cerimônia da Páscoa (na noite anterior à saída do Egito), a abertura do Mar Vermelho e a peregrinação do povo até o Monte Sinais, onde Deus deu a Moisés os Dez Mandamentos e instruções sobre como o povo deveria ser organizado.

O livro do Levítico é considerado por quase todo mundo o mais chato da Bíblia: trata-se de uma coleção de leis dados por Deus a Moisés e uma lista das punições relacionadas com o descumprimento dessas leis.

É nele que estão contidas leis que hoje consideramos ultrapassadas – por exemplo, proibição de comer carne de porco ou condenação à morte por apedrejamento de quem cometer heresia. Mas também tem muitas outras leis, que continuamos seguindo até hoje.

O livro de Números fala essencialmente da organização de Israel e da sua peregrinação pelo deserto por longos quarenta anos, fruto de um castigo dado por Deus porque o povo não teve fé, quando se viu às portas da Terra Prometida - duvidou da sua capacidade de conquistar aquele território (Números capítulo 13, versículos 1 a 25 e 14, versículos 1 a 38).

Na prática, esse período de quarenta anos no deserto serviu para Israel se organizar melhor e amadurecer, passando de um bando de escravos a um povo guerreiro e confiante.

O livro do Deuteronômio tem uma história interessante: por algum motivo acabou esquecido e somente foi encontrado por acaso, séculos depois de ter sido escrito (2 Reis capítulo 22, versículos 1 a 10 e capítulo 23, versículos 1 e 2) e incorporado ao Pentateuco.

O livro fala dos últimos dias antes de Israel entrar na Terra Prometida. Relembra muita coisa contada no Êxodo e repete/aprofunda várias leis dadas anteriormente.

Conta também os últimos dias de Moisés (que não entrou na Terra Prometida junto com Israel) e fala da Aliança de Deus com seu povo - as bençãos para a obediência e punição para o desvio da vontade de Deus.

Resumindo, o Pentateuco é um conjunto de textos fundamentais para entendermos como o povo de Israel foi formado e como sua Aliança com Deus foi estabelecida. E serve também para sabermos como Deus espera que venhamos a nos comportar, o que fica claro a partir das leis que estão contidas ali.

Com carinho

domingo, 17 de julho de 2016

O LIVRO DE SALMOS E A VIDA DE DAVI

O livro de Salmos é um dos mais queridos da Bíblia - é citado a toda hora, inclusive em passagens do Novo Testamento. 


Os salmos são poesias. Normalmente, eram entoadas com o acompanhamento de instrumentos, assemelhando-se aos hinos de hoje em dia. Alguns salmos eram usados em ocasiões especiais, por exemplo durante as peregrinações a Jerusalém (conhecidos como “salmos de ramagem”).

Quando falamos do livro de Salmos, imediatamente vem à mente de todos(as) o rei Davi, pois ele foi o autor da maioria deles e dos que se tornaram mais famosos, como o de número 23. Mas há outros autores de salmos, como os filhos de Coré e Asafe.

Essas poesias tratam de temas importantes como o louvor a Deus, as dúvidas da fé, o sofrimento, a esperança nas promessas de Deus, sentimentos bem humanos, que podem se fazer presentes na vida de qualquer pessoa. É exatamente por isso que as pessoas se identificam e gostam tanto dos salmos.

Há várias formas de estudar o livro de Salmos - por exemplo, escolher um tema (digamos, o sofrimento humano) e encontrar todas as referências a ele ao longo do livro, comparando as várias formas usadas pelos autores para discutir tal tema.

Outra forma de estudar o mesmo livro, muito interessante, embora pouco usada, é usar como eixo a vida de Davi e acoplar a cada momento vivido por ele o salmo correspondente a essa fase da sua vida. Isso proporciona uma chave de interpretação para cada salmo, qual seja o sentimento de Davi ao escrevê-lo. 

Evidentemente, um salmo escrito quando Davi subiu ao trono de Israel, momento de grande alegria para ele, certamente deve ter diferença de tom em relação a texto escrito durante sua perseguição pelo rei Saul, quando estava profundamente angustiado.

Essa abordagem dá um colorido especial a cada salmo, além de ensinar muito sobre a vida de Davi, que foi muito interessante.

Para exemplificar, escolhi dois salmos escritos em momentos bem diferentes da vida em Davi. O primeiro é o conhecido salmo 23, escrito quando Davi ainda não tinha passado por sofrimento e professava fé mais ingênua. 

Ele morava na corte real e ainda gozava do favor do rei Saul e refletiu no texto do salmo 23 sobre sua vida simples, mas agradável, quando era simples pastor de rebanhos. Vejamos o texto desse salmo:

O Senhor é o meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam. Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do Senhor por longos dias.

O tom de Davi nesse lindo texto é esperançoso e alegre. E por isso é tão amado pelas pessoas. Ele usa muitas referências tiradas da sua vida de simples pastor de animais - "águas tranquilas", "cajado", "pastos verdejantes", etc. 

O segundo salmo é o 51, escrito num momento terrível da vida de Davi - depois que ele tinha cometido o pecado de adultério com Bate-Seba. 

Davi já era naquela altura rei poderoso e rico, morando num belo palácio, em sua capital, em Jerusalém. Esse enorme sucesso acabou subindo à sua cabeça e esse problema está na raiz do pecado que cometeu

Ele adulterou com Bate-Seba e não satisfeito com isso, mandou matar seu marido, Urias. Em dado momento, Deus interviu, mandando o profeta Natã alertar Davi para seu pecado. Só aí o rei percebeu a enormidade do mal que tinha feito e caiu em profundo arrependimento.

Foi quando escreveu o salmo 51. Vejamos o que ele disse nos versículos 1 a 12:

Tem misericórdia de mim, ó Deus, segundo a tua benignidade; apaga as minhas transgressões, segundo a multidão das tuas misericórdias. Lava-me completamente da minha iniquidade, e purifica-me do meu pecado. Porque eu conheço as minhas transgressões, e o meu pecado está sempre diante de mim. Contra ti, contra ti somente pequei, e fiz o que é mal à tua vista, para que sejas justificado quando falares, e puro quando julgares. Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe. Eis que amas a verdade no íntimo, e no oculto me fazes conhecer a sabedoria. Purifica-me com hissopo, e ficarei puro; lava-me, e ficarei mais branco do que a neve. Faze-me ouvir júbilo e alegria, para que gozem os ossos que tu quebraste. Esconde a tua face dos meus pecados, e apaga todas as minhas iniquidades. Cria em mim, ó Deus, um coração puro, e renova em mim um espírito reto. Não me lances fora da tua presença, e não retires de mim o teu Espírito Santo. Torna a dar-me a alegria da tua salvação, e sustém-me com um espírito voluntário.

O texto do salmo 51 é angustiado, cheio de culpa e arrependimento. Davi percebeu por causa dos seus atos, sua vida nunca mais seria a mesma, como de fato não foi - ele nada mais fez de relevante, embora seu reinado ainda tenha durado cerca de dez anos, e passou por problemas terríveis, inclusive a revolta liderada por ser próprio filho. 

Os salmos 23 e 51 são muito distintos, em termos de tom, conteúdo dos sentimentos expostos e aspectos da relação de Davi com Deus neles invocados. O salmo 23 é esperançoso, alegre, escrito porque quem se considerava justo. Já o salmo 51 mostra uma alma angustiada, um coração cheio de remorsos e arrependimento e contem um pedido desesperado pelo perdão de Deus. 

Ambos os textos foram escritos pelo mesmo homem, mas em momentos bem diferentes da sua vida, em circunstâncias históricas bem distintas. Daí serem tão diferentes.

E acredito que por isso mesmo, exemplificam bem os altos e baixos pelos quais a vida espiritual de cada um(a) de nós costuma passar.

Com carinho

sexta-feira, 15 de julho de 2016

COMO A BÍBLIA ESTÁ ORGANIZADA


A Bíblia está dividida em duas grandes partes - Velho e Novo Testamentos -, escritas em épocas diferentes e em línguas distintas (respectivamente em hebraico e grego).

O texto bíblico está organizado em livros, capítulos (contendo títulos) numerados e versículos numerados. Os capítulos (com títulos) e os versículos não faziam parte do texto original, tendo sido acrescentados depois (entre os anos de 900 e 1.500) para facilitar a consulta ao texto bíblico que é muito extenso. 

Por serem recursos introduzidos bem depois do que os textos foram escritos, costumam haver pequenas diferenças nos números de capítulos e versículos, bem como nos títulos dos capítulos, quando são comparadas diferentes versões da Bíblia. 


A organização do Velho Testamento 
O Velho Testamento também é conhecido como Bíblia Hebraica porque é o Cânone reconhecido pelos judeus - os livros, na versão judaica, são apresentados em ordem diferente da seguida pelos(as) cristãos(ãs).

O texto do Velhos Testamento contem trinta e nove livros dividido em quatro partes:

Pentateuco 
Conjunto de cinco livros (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio) que contém os relatos dos primórdios da humanidade e do povo judeu, inclusive a saída da escravidão no Egito. Contém também a Lei dada por Deus.

A autoria do Pentateuco é tradicionalmente atribuída a Moisés, embora pelo menos exista mais um autor desses textos, pois o relato fala da morte e do enterro do próprio Moisés, parte que obviamente não poderia ter sido escrita por ele. Há diversas teorias sobre o número de autores (de um até cinco) que escreveram o Pentateuco mas essa discussão foge ao escopo deste post. 

Livros Históricos 
Doze livros - Josué, Juízes, Rute, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, 1 e 2 Crônicas, Esdras, Neemias e Ester - de autores desconhecidos, provavelmente historiadores oficiais da corte dos reis de Israel e Judá. Esses livros contam a saga do povo de Israel por cerca de 1.000 anos, desde sua entrada na Palestina, até o retorno do exílio da Babilônia. 

Livros da Sabedoria 
Cinco livros - Jó, Salmos (o hinário do povo de Israel), Provérbios, Eclesiastes e Cantares de Salomão. O primeiro livro tem autor desconhecido, o segundo foi escrito por diversos autores (a maior parte pelo rei Davi) e os outros três foram escritos parcialmente pelo rei Salomão, certamente com a contribuição de outros autores (não sabemos ao certo quantos). 

Livros Proféticos 
Dezessete livros - Isaías, Jeremias, Lamentações de Jeremias, Ezequiel, Daniel, Oseias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miqueias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias - escritos por diferentes profetas. É importante observar que profecia, do ponto de vista bíblico, não é apenas uma mensagem sobre o que vai acontecer no futuro (conforme muitos entendem hoje em dia), mas principalmente conselhos, orientações, críticas e outras manifestações transmitidas ao povo por pessoas chamadas especificamente por Deus para desempenhar esse papel. 

A organização do Novo Testamento 
O Novo Testamento é formado por vinte e sete livros, divididos em quatro partes:

Evangelhos 
Quatro livros - Mateus, Marcos, Lucas e João - que são essencialmente relatos da vida e do ministério de Jesus. A tradição indica que eles foram escritos por apóstolos (Mateus e João) ou por companheiros de apóstolos (Lucas, companheiro de Paulo, e João Marcos, companheiro tanto de Paulo como de Pedro).

Por conta dessa proximidade de Jesus, os evangelistas tiveram acesso privilegiado a informações do que de fato aconteceu durante a vida d´Ele, especialmente durante os três anos do seu ministério.

Relato do início da história da Igreja Cristã 
O livro do Ato dos Apóstolos, escrito por Lucas, o mesmo que escreveu um dos Evangelhos, conta a história do início da vida da Igreja cristã. Contem muitos relatos interessantes, como o dia do Pentecostes (a chegada do Espírito Santo), o primeiro Concílio da Igreja, as questões políticas, as viagens de Paulo e muito mais. 

Cartas apostólicas 
Vinte e uma cartas escritas por diferentes apóstolos. Foram dirigidas para igrejas locais ou pessoas e contem orientações sobre doutrina e comportamento cristão, como também arbitram conflitos locais. 

As cartas também contam alguns fatos sobre o início da vida da igreja, completando o relato do Atos dos Apóstolos. Os autores das cartas são: 
  • Paulo: Romanos, 1 e 2 Corintios, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, 1 e 2 Tessalonicenses, 1 e 2 Timóteo, Tito e Filemon. 
  • Autor desconhecido: Hebreus. 
  • Tiago (irmão de Jesus): uma carta de mesmo nome. 
  • Pedro: 1 e 2 Pedro. 
  • João: 1, 2 e 3 João. 
  • Judas: uma carta de mesmo nome. 
Apocalipse 
Livro atribuído ao apóstolo João (o mesmo que escreveu um dos Evangelhos e três cartas), que fala sobre uma visão que o apóstolo teve do Cristo Glorificado (Jesus depois que voltou para junto de Deus Pai).

O texto contem muitos símbolos e metáforas, para não poder ser compreendido por gente que não fosse cristã, para fugir a perseguição que havia naquela época (final do primeiro século da nossa era).

O Apocalipse fala essencialmente do que vai acontecer no final dos tempos e introduz personagens como a Besta do Apocalipse (o Anti-Cristo), o Falso Profeta, as Duas Testemunhas, etc.

Eu tenho um longo estudo aqui no site sobre o Apocalipse, para aqueles(as) interessados(as) em conhecer mais sobre esse texto tão interessante.

Comentário final 
Todos esses livros, escritos por dezenas de autores, guardam um tesouro de ensinamentos que continuam atuais. O que mais impressiona é a harmonia dos livros, cujos se complementam e nunca entram em contradição.

Isso é justificado pelo fato que todos os textos foram inspirados pelo Espírito Santo, que orientou cada autor sobre o que devia ou não dizer. É exatamente por isso que nós, cristãos(ãs), entendemos a Bíblia como a Palavra de Deus, nossa regra de fé e de comportamento. 

Com carinho