sábado, 29 de fevereiro de 2020

FICANDO LIVRE DO REMORSO EXCESSIVO


Remorso é um sentimento comum e bastante destrutivo. As pessoas que nutrem esse tipo de sentimento por muito tempo, sem conseguir se livrar dele, acabam passando por problemas sérios, inclusive de saúde.
Os depoimentos de pessoas que sofrem com o remorso são praticamente unânimes ao registar que a vida parece perder todo o encanto. Essas pessoas sentem que perderam o direito de serem felizes a ate´de receber bençãos de Deus.

O remorso nasce quando a pessoa toma consciência de ter cometido um pecado muito sério. Nessa situação, duas coisas podem acontecer. A primeira delas é a pessoa pedir perdão a Deus, aceitar sua graça e sentir-se perdoada. E o problema do remorso é superado, embora cada vez que a pessoa se lembre do pecado cometido ela sinta um aperto no coração. Esse aperto funciona como a "cicatriz" de um ferimento já curado. mas que costuma latejar quando o tempo muda.

É a pessoa com remorso ficar meio "congelada" espiritual e emocionalmente. No seu íntimo, essa julga que seu pecado foi tão sério que ela não mais é digna de perdão. Aí, a pessoa acaba se entregando ao remorso.

Ora, do ponto de vista da doutrina cristã, somente a ofensa contra o Espírito Santo não pode ter perdão e é muito raro que as pessoas venham a cometer esse tipo de pecado (veja mais). Portanto, na esmagadora maioria dos casos, as pessoas continuam a sentir remorso por pecados que podem, e muitas vezes até já fora perdoados.

Lembro do caso de uma mulher que fez um aborto, num momento de desespero, e nunca mais teve paz de espírito. Sua vida tornou-se uma longa e contínua tortura. Seu remorso tornou-seu tão sério que, quando ela engravidou de novo, ficou aterrorizada com a possibilidade do seu bebê nascer com algum problema físico, como punição pelo pecado que tinha cometido. Essa mulher acabou se curando dessa doença espiritual, mas somente depois de muita oração e contando com o apoio de vários irmãos na fé, que oraram com ela e por ela.

O problema com o remorso
A raiz do remorso sem esperança é a falta de confiança na graça de Deus. Um bom exemplo disso é a história de dois apóstolos, que tomaram caminhos diferentes, depois de cometerem o mesmo tipo de pecado: trair Jesus. Um deles Judas, depois de se dar do conta do que tinha feito, acabou se suicidando, por não mais acreditar que poderia ser perdoado por Deus. Já Pedro, apóstolo que negou Jesus três vezes, confiou na graça de Deus, foi perdoado e seu ministério restaurado.

Dois apóstolos, ambos pecadores e ambos sofrendo de remorso. Um recuperou-se, enquanto o outro levou esse sentimento às últimas consequências e destruiu a própria vida. A diferença entre o destino deles foi consequência exclusiva da sua relação com a graça de Deus: Pedro manteve a confiança nela e foi restaurado. Já Judas, duvidou da graça e se viu sem saída.

Não importa qual tenha sido seu pecado, se você se arrepender e confiar na graça de Deus, você será perdoado(a). E, depois disso, poderá seguir em frente com sua vida normalmente, inclusive exercendo o ministério espiritual que Deus eventualmente tenha separado para você.

E a sua garantia para o perdão é simples: a graça de Deus. E o selo dessa graça é o sangue que Jesus derramou na cruz por cada um de nós. É assim que funciona a fé cristã.

Com carinho

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

CUIDADO COM O ABUSO DA BÍBLIA

Tem gente que comete abuso com o texto da Bíblia. E isso é coisa muito séria porque a Bíblia é a Palavra de Deus e nosso preceito de vida. É ela que nos ensina sobre a vontade de Deus e as consequências dos nossos atos.

O texto da Bíblia não tem erros, por ser a Palavra de Deus, e assim pode ter toda a nossa confiança. Essa é uma verdade conhecida. Mas, a mesmo confiança não pode ser garantida quanto às interpretações feitas a partir do texto bíblico. Essas interpretações são humanas e, portanto, passíveis de erros.

Interpretações erradas, mesmo quando não tenham sido construídas de propósito, acabam sendo uma forma de "abuso" da Bíblia. Afinal, quando alguém consegue convencer outras pessoas a aceitar ideias erradas, apoiando essas ideias erradas na Bíblia, as consequências costumam ser muito sérias. 

Os abusos da Bíblia são bem mais comuns do que você possa pensar à primeira vista. Um bom exemplo desse tipo de coisa é o ensinamento que Deus quer nos ver prósperos, bastando, para que isso aconteça, ter fé e fazer grandes contribuições a determinadas igrejas. Outro exemplo de abuso é a imposição de controles indevidos sobre o comportamento das pessoas para "impedi-las" de pecar. Aí vale proibir todo tipo de música que não seja gospel, vestir-se de determinada forma, ver determinados filmes e programas de televisão, conviver com pessoas não convertidas e assim por diante.

Muitas vezes, por causa desses abusos ao texto bíblico, pessoas são convencidas a carregar culpas que não deveriam ter. Este site mesmo é testemunha dos depoimentos de inúmeras pessoas que sofreram com esse tipo de situação.

Abusos bíblicos podem nascer tanto de erros sinceros, como também de interesses desonestos. É claro que o resultado final de um erro sincero ou de um abuso desonesto pode ser igualmente grave, mas, aos olhos de Deus, certamente existem diferenças entre esses dois casos. E, se não fosse assim, não me atreveria a escrever neste site, pois, certamente, em meio a mais de 700 textos, já cometi erros sinceros. E não há como evitar isso, pois seres humanos são imperfeitos e limitados. 

Mas, quem erra de forma sincera nunca pode se esquivar de consertar seus erros, assim que se der conta deles. É preciso ser humilde. E, sobretudo, tomar cuidado para nunca se beneficiar pessoalmente dos próprios erros.

Agora, quem abusa conscientemente da Bíblia, costuma fazer isso para tentar usá-la para obter algum benefício ou concorrer para alguma agenda pré-estabelecida. E a própria Bíblia alerta que haverá grande rigor no julgamento final para quem cometer esse tipo de pecado (Mateus capítulo 23, versículos 1 a 8).

A experiência mostra que há três tipos de abuso consciente da Bíblia:
O contrabando de ensinamentos
Afirmar que a Bíblia fala coisas que não estão no texto bíblico. Por isso sempre que peço à pessoa que fez uma afirmação sobre tema que desconheço para mostrar onde a Bíblia dá suporte para aquela ideia. Não tenho prazer de dizer isso, mas já vi muita gente embaraçada por causa desse expediente bem simples.
Os contrabandos variam quanto ao nível de periculosidade. Alguns são tão grosseiros que são mais fáceis de identificar - por exemplo, afirmar que a voz do povo é igual à voz de Deus. Para provar que isso não é verdade, basta lembrar que o povo judeu em Jerusalém preferiu que Pilatos soltasse Barrabás no lugar de Jesus.

Mas, há abusos que embutem armadilhas sutis, pois parecem se encaixar no quadro bíblico, mas são "comida envenenada". Por exemplo, afirmar que todos os seres humanos são filhos de Deus. Ora, a Bíblia diz que todos somos criaturas de Deus, mas somente quem aceita Jesus torna-se filho/a de verdade.

Não é fácil para quem tenha pouco conhecimento da Bíblia separar o joio do trigo, quando alguém faz uma afirmação desse tipo. Por isso recomendo que você, quando preciso, procure ajuda de quem alguma pessoa em quem confie e que saiba mais sobre a Bíblia.
Eliminação do que incomoda
A segunda forma de abusar da Bíblia é deixar de reconhecer como válidas ensinamentos reais mas que são incômodos. As estratégias mais conhecidas para fazer isso são: atribuir o ensinamento indesejado a um erro de tradução; ou alegar que o ensinamento não se aplica aos dias de hoje; ou ainda simplesmente omitir o ensinamento incômodo.
É claro que há erros de tradução. Um exemplo conhecido é aquele em que a tradução tradicional diz que pessoas, no tempo de Gideão, adoraram uma estola sacerdotal (Juízes capítulo 8, versículo 27). Esse é um erro de tradução pois, na verdade, trata-se da adoração a um ídolo vestido com roupa, o que faz muito mais sentido no texto.

Erros de tradução são muito fáceis de perceber quando se usa traduções de origens diferentes, bastando comparar as diferentes versões.

É verdade que existem sim ensinamentos que não se aplicam mais aos dias de hoje, como as referencias a trajes especiais ou hábitos alimentares. Mas, é preciso muito cuidado ao alegar esse tipo de coisa. Um bom exemplo é a questão do dízimo, que muitos defendem não ser mais necessário. Ora, se fosse assim, como então igrejas e sacerdotes iriam ser mantidos?

A omissão pura e simples é fácil de perceber pois basta checar o que foi dito em comparação com o texto bíblico. Você deve sempre tomar a precaução de fazer tal comparação. E é por isso eu procuro quase sempre citar o versículo bíblico de onde tirei a firmação que acabei de fazer num dos meus textos.

Ma,s há uma situação particularmente grave de omissão. Ela ocorre quando as Bíblias dadas aos fiéis são expurgadas daquilo que não interessa. O exemplo clássico é a Bíblia publicada pela Sociedade Torre de Vigia, entidade da seita Testemunhas de Jeová, que amputa vários versículos do texto original sem fazer referência a isso.
Desconsideração do contexto
A forma de abuso mais comum e também a mais efetiva: tirar o ensinamento bíblico do contexto. Isto é, usar o que foi dito numa determinada circunstância para dar suporte a circunstância totalmente diferente, onde o ensinamento não mais se aplica.
Um bom exemplo é o uso do texto de Gênesis capítulo 3, versículo 19, onde Deus disse a Adão "no suor do seu rosto , comerás o teu pão..." para justificar a proibição de jogos de azar. Ora, esse texto aparece quando Deus amaldiçoou a Adão, porque ele e Eva tinham sido desobedientes. Deus quis dizer que não iria mais dar a Adão e Eva seu sustento, como até então tinha acontecido no Jardim do Éden. Eles iriam precisar trabalhar para se sustentar. Ora, isso nada tem a ver com jogos de azar. Nada mesmo.

Não estou dizendo que apoio os jogos de azar, mas sim que não é possível ir contra eles com base nessa passagem. É preciso buscar outro tipo de suporte.
Palavras finais
Esteja sempre atento(a) ao uso que é feito da Bíblia, especialmente quando as pessoas tentarem convencer você de alguma coisa, recomendar algum tipo de comportamento ou pedir sua ajuda com base em alguma passagem bíblica.
Nunca tenha vergonha de sempre conferir o que foi afirmado. Afinal, é até sua obrigação agir assim. 
Com carinho

domingo, 23 de fevereiro de 2020

ORAÇÃO E O SILÊNCIO DE DEUS

Muitas vezes parece ser que nossas orações encontram como resposta apenas o silêncio de Deus. Parece não haver qualquer reação dele em resposta aos pedidos, até meio desesperados, que fazemos, quando precisamos de ajuda e proteção. E esse silêncio de Deus causa grande perplexidade.

É sobre isso que o profeta Habacuque fala no começo do seu livro na Bíblia. Ali o profeta se queixa que o silêncio de Deus ficou ainda mais insuportável porque, enquanto Israel corre enorme perigo, os ímpios parecem prosperar - tudo vai indo bem para eles. Habacuque demonstra estar muito confuso com esse tipo de situação. Não sabe bem o que pensar ou dizer.

Se olharmos à nossa volta, aqui no Brasil, vivemos uma situação bem parecida. Vemos muitas pessoas de bem passando por grandes dificuldades, geradas pela difícil situação econômica do país. Enquanto isso políticos corruptos e criminosos de toda a espécie nadam em dinheiro e vivem uma vida farta. E é difícil aceitar esse estado de coisas. É difícil se conformar com a situação.

Como lidar com esse paradoxo? Como entender os planos de Deus em momentos como esse? É sobre isso que o Rogers fala no seu mais novo vídeo - veja aqui.

Veja outros vídeos recentes meus aqui e aqui.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

A IRA NÃO JUSTIFICADA


A ira é sempre um pecado? Talvez você se surpreenda em saber que não. Somente a ira não justificada é pecado. Veja o que Paulo ensinou a esse respeito em Efésios 4:26:
Quando vocês ficarem irados, não pequem. Apaziguem a sua ira antes que o sol se ponha, e não deem lugar ao diabo.
Fica claro pelo texto acima que é possível ter ira, e ainda assim não pecar. Isso porque o pecado não está no sentimento em si e sim naquilo que motiva a ira e nas ações que a pessoa toma a partir dela.

É possível sim haver situações em que a pessoa fique irada, mas não peque, tanto porque o motivo da sua ira é justo aos olhos de Deus, como também porque as ações decorrentes desse sentimento não violam os mandamentos divinos. Um bom exemplo de ira justificada é quando uma pessoa fica fortemente incomodada por conta de uma grave injustiça social e atua para minorar esse mal. Em situações desse tipo, a ira até aproxima a pessoa de Deus e podemos, portanto, dizer que ela é boa.

Não vamos tratar aqui da ira justificada aos olhos de Deus, pois isso vai ser feito em outra oportunidade. Vamos nos concentrar na situação bem mais comum da ira não justificada, que normalmente leva a pessoa ao pecado. 
O que provoca a ira não justificada
Esse tipo de sentimento costuma ser a resposta da pessoa ao que ela entender ser uma transgressão aos seus “direitos”. Esses “direitos” podem ser reais, ou apenas imaginados. E a transgressão não precisa se materializar, podendo ficar apenas no campo da fantasia (a pessoa acha que sofreu um ataque, quando de fato nada ocorreu).
Vamos ver um exemplo simples. Imagine que alguém tenha um compromisso importante, mas saiu de casa atrasada para esse encontro. E a pessoa vai tentando chegar ao local do encontro a tempo, dirigindo em meio a um trânsito pesado. E o trânsito parece conspirar contra o desejo da pessoa e ela vai se atrasando mais e mais.

E, de repente, a ira chega, passando a ser dirigida a qualquer outro motorista que pareça estar atrapalhando. A pessoa atrasada detesta o sentimento de impotência que está sentindo, ao ficar retida no trânsito congestionado, sem ter como sair da armadilha onde se meteu. E a ira se torna uma válvula de escape - os outros motoristas passam a ser culpados por não “colaborarem”.

A pessoa atrasada acha que tem o “direito” de ter caminho livre e imagina que seu “direito” está sendo transgredido por outros motoristas. E aí, normalmente, bate a raiva, que se materializa em xingamentos e direção agressiva.

Quanto maior a frustração e a sensação de injustiça sendo sofrida, mais virulenta será a resposta e maior será a raiva.
Os problemas com a ira não justificada
São dois os problemas relacionados com a ira não justificada. Um deles é que a ira se dá pelas razões erradas. Por exemplo, a pessoa está atrasada por culpa dela mesma (saiu atrasada e não levou o trânsito em conta), mas acaba se irando contra terceiros. Outro exemplo interessante é quando a pessoa se ira porque não recebeu determinada promoção, à qual julgava ter direito, sem nem procurar saber as razões para a decisão da direção da empresa. Ainda um outro bom exemplo ocorre quando a pessoa recebe uma crítica justa, mas dolorosa, e se ira contra quem a criticou, acusando quem fez isso de agressivo, mal-educado ou intolerante.
O outro problema decorrente da ira injustificada é que ela costuma ser dirigida contra as pessoas erradas. Veja o que disse Davi no Salmo 109:1-13:
Ó Deus, a quem louvo, não fiques indiferente, pois homens ímpios e falsos dizem calúnias contra mim, e falam mentiras a meu respeito. Eles me cercaram com palavras carregadas de ódio; atacaram-me sem motivo. Em troca da minha amizade eles me acusam, mas eu permaneço em oração. Retribuem-me o bem com o mal, e a minha amizade com ódio. Designe-se um ímpio como seu oponente; à sua direita esteja um acusador. Seja declarado culpado no julgamento, e que até a sua oração seja considerada pecado. Seja a sua vida curta, e outro ocupe o seu lugar. Fiquem órfãos os seus filhos e a sua esposa, viúva. Vivam os seus filhos vagando como mendigos, e saiam rebuscando o pão longe de suas casas em ruínas. Que um credor se aposse de todos os seus bens, e estranhos saqueiem o fruto do seu trabalho. Que ninguém o trate com bondade nem tenha misericórdia dos seus filhos órfãos. Sejam exterminados os seus descendentes e desapareçam os seus nomes na geração seguinte.
Davi estava irado, e acredito até que tivesse uma boa razão para se sentir assim. Mas, ele não justificativa para dirigir sua raiva para as famílias das pessoas que eventualmente lhe fizeram mal. Os familiares não tinham qualquer culpa.

E esse não é o único caso em que os Salmos registram acessos de ira não justificada. O grande escritor cristão C. S. Lewis observou, com muita razão, que os textos dos Salmos frequentemente não refletem as virtudes cristãs, e sim a cultura do “olho por olho”, típica do Velho Testamento.

A ira não justificada, tanto por não ter base sólida, como por se dirigir ao objeto errado, acaba sendo feia, destruidora e vingativa. 
Causas da ira não justificada
Há duas causas mais comuns para esse tipo de ira. A primeira delas é o desejo de ter agora um mundo melhor e mais tolerável. A pessoa se irrita quando percebe não ter controle sobre as coisas, pessoas e circunstâncias da sua vida. 
Saul era o rei de Israel, mas não cabia a ele conduzir sacrifícios e outras ministrações junto a Deus, ministério reservado ao profeta Samuel. Certa vez, Saul viu-se na contingência de aguardar Samuel e acabou ficando irado por causa disso (1 Samuel 13:8-14):
Ele esperou sete dias, o prazo estabelecido por Samuel; mas este não chegou a Gilgal, e os soldados de Saul começaram a se dispersar. Então ele ordenou: "Tragam-me o holocausto e os sacrifícios de comunhão". Saul ofereceu então o holocausto, e quando ele terminou de oferecê-lo, Samuel chegou, e Saul foi saudá-lo. E perguntou-lhe Samuel: "O que você fez? " Saul respondeu: "Quando vi que os soldados estavam se dispersando e que você não tinha chegado no prazo estabelecido e que os filisteus estavam reunidos em Micmás, pensei: ‘Agora, os filisteus me atacarão em Gilgal, e eu não busquei o Senhor’. Por isso senti-me obrigado a oferecer o holocausto". Disse Samuel: "Você agiu como tolo, desobedecendo ao mandamento que o Senhor seu Deus lhe deu; se você tivesse obedecido, ele teria estabelecido para sempre o seu reinado sobre Israel. Mas agora seu reinado não permanecerá; o Senhor procurou um homem segundo o seu coração e o designou líder de seu povo, pois você não obedeceu ao mandamento do Senhor".
A pessoa sente não ter a autonomia na sua vida que gostaria de gozar e não se conforma com isso. Revolta-se e quer, a todo custo, fazer algo para ganhar controle da situação. 
A outra causa comum para a ira não justificada é a frustração do desejo de conseguir algo importante, ou mesmo o risco de perder algo de valor. Nesses casos, a pessoa afetada se acha com toda a razão do mundo para ficar irada, afinal está defendendo seu direito. E vale até o uso da violência.
Por exemplo, a criança pequena vê seu amiguinho tentando brincar com o velocípede que ela acabou de ganhar no Natal. E, mesmo quando não está usando o novo brinquedo, ela fica enraivecida com o amiguinho, pois o percebe como um rival que ameaça seu direito de posse.
A Bíblia tem um exemplo muito chocante desse tipo de situação. Caim estava obcecado em obter o favor de Deus e se enraiveceu quando percebeu que a mão divina favorecera Abel, seu irmão. E matou o irmão por causa disso (Gênesis 4:3-8):
Passado algum tempo, Caim trouxe do fruto da terra uma oferta ao Senhor. Abel, por sua vez, trouxe as partes gordas das primeiras crias do seu rebanho. O Senhor aceitou com agrado Abel e sua oferta, mas não aceitou Caim e sua oferta. Por isso Caim se enfureceu e o seu rosto se transtornou. O Senhor disse a Caim: "Por que você está furioso? Por que se transtornou o seu rosto? Se você fizer o bem, não será aceito? Mas se não o fizer, saiba que o pecado o ameaça à porta; ele deseja conquistá-lo, mas você deve dominá-lo". Disse, porém, Caim a seu irmão Abel: "Vamos para o campo". Quando estavam lá, Caim atacou seu irmão Abel e o matou.
A doutrina cristã ensina que tal sentimento desmedido de posse é fruto do vazio da alma humana, que aparece quando a pessoa está distante de Deus. A pessoa sente o vazio e quer, a todo custo, preenchê-lo. E pensa que vai conseguir fazer isso por meio da posse de coisas e/ou pessoas.
É fácil para quem se sente assim achar que Deus é injusto. Afinal, há gente no mundo mais bonita, com mais riquezas, com sucesso maior e com realizações mais expressivas. É fácil a pessoa achar que merece mais do aquilo que já tem. 

Na verdade, ambos os casos são formas de revolta contra Deus, como Criador e Mantenedor do universo. As pessoas se iram porque querem ter uma autonomia que Deus não lhes franqueou ou porque se sentem injustiçadas por Deus. E a ira injustificada vira um "martelo" que a pessoa usa para tentar romper as cadeias daquilo que lhe parece ser uma servidão. Por isso a ira injustificada afasta a pessoa de Deus. Por isso ela vira pecado.

A ira não justificada nunca produz a justiça e ela tende a fazer com que a pessoa se afaste de Deus, portanto é preciso ter muito cuidado com ela. É  esse o ensinamento de Tiago 1:19-20:
Meus amados irmãos, tenham isto em mente: Sejam todos prontos para ouvir, tardios para falar e tardios para irar-se, pois a ira do homem não produz a justiça de Deus.
Concluindo, é preciso ainda comentar sobre a resposta que Deus deu à ira humana. E ela é surpreendente. Deus não faz valer sua soberania e seu poder incontestável. Sua resposta não é calar à força a ira humana, por mais surpreendente que isso seja.
Deus responde nos dando Jesus, que abre o caminho para que possamos reconstruir nossa relação com Ele. Jesus é o único remédio efetivo contra a ira humana sem justificativa.
Com carinho

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

VOCÊ SABE QUAL É A SUA MISSÃO?

É muito comum que os gestores de uma grande empresa se reúnam para escrever, em conjunto, a declaração da missão da organização que dirigem. Trata-se de alguns poucos parágrafos de texto estabelecendo o que a empresa se propõe a ser e a fazer no mercado que atende.

Normalmente, essa declaração é criada ao fim de longo processo de estudo, onde essas pessoas analisam a empresa em todos seus aspectos - história, vocação, vantagens competitivas, desvantagens, riscos que corre, oportunidades que pode explorar, etc.

O documento contendo a missão costuma ser amplamente divulgado para todos os colaboradores, sendo emoldurado em quadros espalhados pelos escritórios da organização. 

No melhor dos mundos, o conteúdo dessa declaração acaba por se tornar parte da cultura organizacional e termina por influenciar a forma como a organização opera no dia-a-dia. Infelizmente, na maioria das vezes, as intenções ali descritas ficam limitadas ao papel, sem gerar maiores consequências práticas.

Quando Jesus apresentou sua missão 
Jesus também fez uma declaração de sua missão. E fez isso logo no começo do seu ministério, como seria de se esperar.

Ele estava visitando Nazaré, vilarejo onde fora criado, e foi até a sinagoga local. Jesus já tinha certo nome como rabino, pessoa que falava com autoridade sobre as coisas de Deus. Logo, não foi por acaso, que os líderes da sinagoga de Nazaré convidaram-no a ler a Bíblia (naquela época composto apenas do Velho Testamento) e comentar sobre o que tivesse lido.

E Jesus escolheu um texto do profeta Isaías (Lucas capítulo 4, versículos 18 a 19) que diz:
O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar aos pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para por em liberdade os oprimidos, e apregoar o ano aceitável do Senhor.
Depois de ler esse texto, Jesus enrolou o pergaminho e declarou para todos (ver versículos 20 e 21): "Hoje se cumpriu a Escritura que acabais de ouvir".

Ele não poderia ter sido mais direto: o texto de Isaías definia com perfeição sua missão na terra e Ele comentou para o as pessoas de Nazaré que já estava cumprindo essa mesma missão. E foi exatamente isso que Jesus fez durante os três anos do seu ministério.

Foi por isso que, quando João Batista já estava preso, e mandou seus discípulos irem até Jesus e perguntarem se Ele era mesmo o Messias, Jesus disse que sim e concluiu perguntando: Estou ou não cumprindo tudo isso?(Lucas capítulo 7, versículos 19 a 23) 

A missão da igreja 
Jesus tinha uma missão e a cumpriu com perfeição. E a igreja cristã também tem sua missão na terra. E cabe a nós, cristãos, cumpri-la. A missão que recebemos envolve três coisas. A primeira é agir sempre em comunidade para que uns possam ajudar e dar apoio aos outros.

É claro que as comunidades cristãs (igrejas locais) fatalmente terão defeitos pois são formadas por seres humanos imperfeitos. Mas, ainda Deus nos quer congregando. E tanto é assim que a Bíblia diz que, quando agimos nas igrejas locais, nos transformamos em sacerdotes de Deus (1 Pedro capítulo 2, versículo 9). E foi esse o exemplo que Jesus deixou ao escolher doze apóstolos (veja mais).

O segundo aspecto da missão da igreja cristã é a obrigação de falar de Jesus em todas as oportunidades (Marcos capítulo 16, versículos 15 e 16). Os cristãos precisam falar do Evangelho de Jesus à medida que seguem pelo mundo, vivendo suas vidas.

Finalmente, a missão da igreja cristã também inclui o cuidado com os pequeninos, ou seja, as pessoas despossuídas (Mateus capítulo 25, versículos 31 a 46). Isso significa:
=>  Dar de comer aos famintos e de beber aos sedentos (tanto no aspecto material como espiritual).
=>  Vestir os que estiverem nus, em outras palavras, garantir a dignidade humana daqueles que a perderam.
=> Cuidar dos que sofrem, como os doentes e os desesperados.
=> Visitar quem estiver preso, tanto fisicamente, como também aqueles aprisionados pelos vícios que os escravizam.
=>  Agir de forma amigável e respeitosa com os pecadores, ajudando-os a mudarem de vida.
=>  Acolher o estrangeiro, isto é, tanto quem muda de país ou cidade, como quem chega na igreja onde congregamos sem conhecer nada e nem ninguém
=>  Defender os mais fracos. 

Palavras finais
Cabe cristão deve se auto examinar e ver se está verdadeiramente cumprindo sua parte na missão que Deus deu para a igreja cristã, da qual somos parte.

E o cumprimento dessa missão não pode nunca se resumir a poucas atividades desempenhadas unicamente aos domingos. Nossa missão, como cristãos, deve pautar nossa vida em todos os momentos, no trabalho ou local de estudo, na família e em todos os demais locais da sociedade.

Com carinho

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

O PEDIDO DE TIAGO E JOÃO


Então Tiago e João, filhos de Zebedeu, se aproximaram d´Ele [Jesus] e falaram: 'Mestre, nós queremos que nos faça um favor'. 'O que vocês querem', perguntou Ele. 'Queremos nos sentar à sua direita e à sua esquerda, na sua glória'. Marcos capítulo 10, versículos 35 a 37
Uma única vez no relato da Bíblia, Deus disse para um ser humano fazer o pedido que quisesse. Ele fez isso para Salomão, o jovem filho de Davi, num momento importante da história do povo de Israel. Salomão estava assumindo o trono do pai, sem muita experiência para liderar seu povo. E era constado por diversos rivais. Por isso precisava de todo apoio que pudesse vir a conseguir.

Salomão pediu sabedoria para governar. E Deus agradou-se tanto dessa resposta que, além da sabedoria, deu também a Salomão poder e riquezas (1 Reis capítulo 5, versículos 5 a 15). Foi como se Deus tivesse dado previamente a Salomão a sabedoria necessária para que o jovem viesse a pedir a coisa certa.

As circunstâncias da passagem que abre esta postagem foram bem diferentes. Os irmãos João e Tiago tiveram a audácia de pedir para Jesus aquilo que provavelmente os demais discípulos gostariam de ter também pedido: glórias no Reino de Deus que estava por vir. Repare que João e Tiago, quando fizeram seu pedido, ainda não tinham entendido a natureza do Reino do qual Jesus tanto falava. Jesus se referia a um reino espiritual, mas seus discípulos estavam pensando num reino material, cheio de riquezas e glória humanas.

O raciocínio de Tiago e João parece ter sido mais ou menos o seguinte: "Deixamos tudo para trás para acompanhar Jesus e nada mais justo do que sermos recompensados à altura, quando Ele passar a reinar sobre Israel". A glória futura seria para eles a justa retribuição.

Idolatria humana
Essa passagem fala sobre a idolatria humana. Idolatria não é apenas adorar imagens de outros deuses. Ela é sobretudo colocar alguma coisa à frente ou no lugar de Deus. E pode ser qualquer coisa: família, poder, dinheiro ou até o time de futebol do coração. Trata-se de substituir Deus por algo que o coração humano deseja muito mais.

Talvez a forma mais comum de idolatria hoje em dia se a pessoa se aproximar de Deus não por quem Ele é, mas pelo que ela pensa poder receber de Deus. Em outras palavras, essa é uma adoração interesseira: adora-se Deus para receber bênção. Deus passa a ser um meio efetivo para que a pessoa possa obter aquilo que deseja na vida.

É interessante perceber que as pessoas chegam ao cúmulo de pedir ajuda a Deus para poder adorar melhor seus ídolos. Por exemplo: "Deus, por favor, faça meu time ganhar esse campeonato". Fazer isso equivale ao caso do marido que pede um favor para sua mulher. E ela prontamente se coloca à disposição, perguntando-lhe o que ele deseja. E o marido responde: "preciso que você me ajude a encontrar uma nova esposa". 

É importante que você examine seu coração e veja se não está indo pelo mesmo caminho. E há duas questões que precisam ser bem verificadas:
  • Será que bem lá no fundo você não pensa que, por ter se tornado cristão, merece ser abençoado por Deus?
  • Ou será ainda que você se esforça na obra de Deus e fica esperando que Ele perceba sua dedicação superior e lhe dê uma bênção especial?
É muito interessante analisar a resposta que Jesus deu para Tiago e João: "não quero que vocês me sirvam, eu vim para servir vocês  - essa é a natureza da minha missão". Jesus não veio para ter glórias e recompensas e sim para fazer o obra de Deus. Ele veio para morrer por nós e nos prestar o maior serviço possível: conseguir o perdão dos nossos pecados, abrindo-nos o caminho da salvação.

Tiago e João eventualmente acabaram aprendendo o que significa ser cristão de fato. Em Atos dos Apóstolos capítulo 12, versículo 1, a Bíblia conta que Tiago foi martirizado. E segundo a tradição cristã, João morreu exilado na ilha de Patmos, por pregar o Evangelho, onde escreveu o livro do Apocalipse (capítulo 1, versículo 9).

Mas certamente ambos estarão junto com Jesus, para toda a eternidade, no seu Reino que ainda está por ser plenamente implantado nesta terra.

Com carinho

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

O AMOR DE JESUS É DIFERENTE


O amor de Jesus é diferente. E vou dar um exemplo simples para comprovar isso. Refiro-me ao caso da restauração de Pedro, depois que ele negou Jesus por três vezes.

Dias depois desse ato de pedro, Jesus, já ressuscitado, o encontrou Pedro numa praia do lago da Galileia. E a ali, a sós, eles tiveram um diálogo que me impressiona muito. Por três vezes, Jesus perguntou a Pedro se o apóstolo o amava e Pedro respondeu sempre que sim (João capítulo 21, versículos 14 a 17).

Quando eu me coloco no lugar de Jesus, imaginando como eu reagiria a Pedro, depois de ser traído por ele, é que percebo a diferença entre a forma de Jesus amar e a minha. A grandeza do amor de Jesus não tem qualquer comparação possível com a maneira humana de amar.

Se um amigo muito íntimo tivesse me traído, como Pedro fez com Jesus, minhas reação mais provável seria acusá-lo: "logo você, que é tão meu amigo, foi capaz de fazer essa coisa horrível comigo..." E provavelmente iria ainda pensar que aquele homem nunca tinha sido meu amigo de fato e certamente romperia relações com ele.

Se esse amigo se arrependesse verdadeiramente e pedisse perdão, é possível que eu até viesse a perdoar - afinal, o perdão é um mandamento de Deus. Mas, provavelmente a amizade nunca mais seria a mesma, sempre haveria uma cicatriz, uma desconfiança pairando no ar.

Jesus não fez nada disso. Não criticou Pedro pelo que o apóstolo tinha feito. E muito menos guardou qualquer mágoa. E nem colocou Pedro sob observação, num período probatório, para verificar se o apóstolo tinha mesmo mudado.

Jesus simplesmente perguntou a Pedro se ele o amava. E quando ouviu a resposta que sim, Pedro o amava, apesar do que tinha feito, Jesus lhe pediu que cuidasse das suas ovelhas, seu bem mais precioso. Ao agir assim, Jesus demonstrou como o amor humano é imperfeito, pois é capaz de traição, egoísmo, engano e outras coisas mais. E como o amor dele, Jesus, é perfeito e completo. 

Agora, vamos olhar para Pedro. Certamente, o apóstolo estava tentando encontrar uma forma de provar seu amor e lealdade para Jesus. Estava ansioso por ser perdoado da traição cometida. Queria a todo custo sair daquela "saia justa".

Pedro não entendeu na hora, mas o que o salvou foi sua fé. Ele se colocou nas mãos de Jesus e acreditou que seu Mestre faria o melhor. Acreditou na misericórdia de Deus e isso foi levado a seu crédito. 

Isso fica bem claro na forma como Pedro respondeu à pergunta de Jesus se o apóstolo o amava: "Senhor, tu sabes de todas as coisas..., certamente sabes que te amo." Pedro invocou o testemunho do próprio Jesus. Acreditou na sabedoria e na justiça de Jesus.  

Jesus não colocou Pedro de castigo. Não demonstrou desconfiança do apóstolo. Não guardou mágoa dele. Muito ao contrário. Ele pediu para Pedro cuidar das suas ovelhas. Entregou nas mãos dele os discípulos que tinha feito até então. Confiou a Pedro o seu legado. E esse foi um ato de profunda confiança. 

Jesus, com essa atitude, nos ensinou que o amor se aperfeiçoa no caminho. É amando que se aprende a amar. É vivendo uma vida cristã que a pessoa aprende a superar suas fraquezas e dificuldades, tornando-se um ser humano de melhor qualidade.

Concluindo, duas lições ficam dessa experiência de Pedro. A primeira é que precisamos aprender a amar mais e melhor. Temos que seguir o exemplo de Jesus e usar nosso amor de forma mais generosa, perdoando e restaurando aqueles que se desviam do caminho certo.

Depois, precisamos aprender a confiar no amor de Jesus. Ele é digno de toda a confiança e por isso, ninguém merece mais do que Ele o nosso amor.

Com carinho 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

PROCURE PELO LÍDER RELIGIOSO CERTO

A grande maioria dos cristãos tem algum líder religioso na sua vida. Normalmente, trata-se do pastor ou pastora da igreja que a pessoa frequenta. Mas, também pode ser um/a professor/a de escola dominical ou outra pessoa com ministério de atendimento.
Um líder religioso bom - fiel aos ensinamentos da Bíblia e comprometido com o Reino de Deus - pode ser uma enorme bênção. Mas um mau líder pode causar enorme estrago espiritual na vida das pessoas. Daí a enorme importância de saber escolher bem, de encontrar a pessoa certa para influir na sua vida espiritual. E o Novo Testamento tem a muito a ensinar a esse respeito.
O povo judeu, na época de Jesus, tinha muitos líderes religiosos diferentes, que acreditavam e lutavam por coisas diferentes. Olhando de fora, todos pareciam querer a mesma coisa - servir a Deus e o bem do povo judeu -, mas na prática a situação era bem diferente. 

O primeiro grupo de líderes religiosos era formado pelos principais sacerdotes, também conhecidos como saduceus. Havia um acordo tácito entre esse grupo e o governo romano, mediante o qual os saduceus ajudavam a manter a ordem e garantiam a colaboração do povo judeu e, em troca, os romanos respeitavam seu status social e lhes garantiam liberdade para conduzir seus negócios. E os principais sacerdotes enriqueciam, por exemplo, com a venda de animais para os sacrifícios realizados no Templo de Jerusalém. 

E os saduceus justificavam seu acordo com os romanos alegando estar protegendo o povo judeu da violência dos conquistadores. Entendiam estar ajudando a manter a paz e a estabilidade, em benefício de todos.

Existem vários líderes religiosos hoje em dia que agem com os saduceus. Eles negociam seu apoio a políticos, durante os períodos de eleição, em troca de vantagens futuras (indicação de protegidos para cargos, participação em contratos governamentais e outras coisas assim). Esses líderes acalmam suas consciências exatamente como os saduceus faziam, alegando estar promovendo políticos comprometidos com causas cristãs e ajudando a promover a paz e a estabilidade. 
Outro grupo de líderes religiosos no tempo de Jesus era formado pelos fariseus. Esses homens seguiam a religião judaica de forma muito estrita e legalista. Eles eram grandes conhecedores das leis contidas na Torá (os cincos primeiros livros do Velho Testamento) e daí vinha seu prestígio junto às pessoas comuns.
Mas, os fariseus queriam impor sua forma de religião aos outros e isso era fonte permanente de atrito com quem pensava de forma diferente deles.  Eles queriam que as pessoas se comportassem exatamente da forma como entendiam ser a certa, taxando quem vivia de forma diferente de pecador/a. Por isso Jesus teve vários embates teológicos com os fariseus, pois Ele se recusou a aceitar a religião legalista que os fariseus defendiam. 

Há vários líderes cristãos que agem como os fariseus. Eles até prestam bons serviços à obra de Deus - e daí vem seu prestígio entre o povo cristão - mas tentam impor suas ideias legalistas, exigindo das demais pessoas que se comportem exatamente da forma como pensam ser a certa. E quem vive de forma diferente é imediatamente ameaçado/a com o Inferno.  

O líder cristão do tipo "fariseu" comete o grave erro de distorcer o espírito do cristianismo, que é uma religião libertadora, tornando-a uma prática opressora. E acabam incentivando a hipocrisia, mesmo sem perceber - as pessoas procuram ficar bem seu líder cultivando uma imagem exterior comportada, enquanto são bem diferentes no seu interior. 
O terceiro tipo de líder religioso no tempo de Jesus era o zelota. Essa liderança não aceitava a dominação romana e defendia o uso de qualquer meio, inclusive a violência, para tentar mudar a situação. Por pensar assim, acabaram por agir sem medir as consequências para o povo judeu - eles promoveram duas revoltas armadas contra os romanos, duramente reprimidas, que causaram grande mortandade, levaram a destruição do Templo de Jerusalém e eventualmente ao exílio dos judeus da Palestina.
Os zelotas atualmente são aqueles líderes que trazer mudanças para o meio cristão, até pelos motivos certos, mas fazem isso sem medir as consequências. Não se preocupam em preservar o que existe, pois a tradição parece ser um erro. E aí mudam as interpretações teológicas tradicionais, que deram origem à identidade dos grupos religiosos que lideram, sem medir consequências. Destroem sem qualquer preocupação as estruturas existentes e até colocam as pessoas que discordem das suas ideias para fora das comunidades que dirigem, tudo bem com a justificação de estar fazendo as mudanças necessárias.

Eles acabam deixando no seu rastro pessoas espiritualmente feridas e igrejas divididas - um cenário desolador. Lembro do caso de um pastor que se tornou o dirigente maior de certa denominação evangélica carismática. Ele chegou à conclusão, não sei bem por qual razão, que as mulheres não deviam ser ordenadas pastoras, coisa que até então permitida naquela denominação.

Ora, havia muitas mulheres ordenadas dentro daquele grupo religioso e o sofrimento causado a essas pastoras foi enorme. Penso que essa denominação nunca se recuperou totalmente do trauma causado naquela época e hoje é uma sombra daquilo que já foi.
O quarto grupo e último grupo de líderes religiosos na época de Jesus era os essênios. Esses homens eram contra tudo e todos. Por causa disso resolveram se afastar da sociedade e passaram a viver em isolamento, em comunidades como a de Quram, onde foram encontrados os famosos manuscritos do Mar Morto.
Os essênios eram pacíficos e nunca criaram grandes problemas, mas sua recusa em se envolver nos problemas diários do povo judeu, tornou-os inúteis. Nada produziram de positivo.

O líder religioso do tipo "essênio" hoje em dia é aquele que vê a sociedade  imersa no pecado e nada quer ter com ela. Não aceita que seus seguidores vejam televisão, ouçam música secular ou socializem com as demais pessoas. Ficam quietos no seu canto, por ser mais confortável, mas não produzem mudanças. 

Ora, Jesus ensinou que os cristãos deveriam ser o sal da terra, ou seja, precisariam mudar o gosto da "comida". Alterar a realidade da sociedade onde estiverem inseridos. E esse ensinamento entra em choque com a postura "essênia", de distanciamento das coisas do mundo.
Jesus trouxe uma liderança religiosa diferente desses quatro tipos. Não fez acordos com os poderosos para facilitar sua própria vida, como os saduceus - por isso acabou morto numa cruz. Não procurou impor às pessoas uma religião legalista, como faziam os fariseus, pois pregou o perdão e a misericórdia para os pecadores. Foi um pacifista e pregou a mudança da sociedade por uma revolução no interior das pessoas - a conversão verdadeira -, nunca pela violência física, como desejavam os zelotas. Mas, também não se isolou do mundo, como faziam os essênios. Ele participou ativamente da sociedade à sua volta, tanto assim que seu primeiro milagre foi feito numa festa de casamento.
Inspire-se do modelo de Jesus para procurar seu líder religioso. Claro que ninguém será perfeito como Ele foi, mas você deve notar no seu líder um esforço verdadeiro para se aproximar desse modelo. 
Com carinho

domingo, 9 de fevereiro de 2020

DEUS PODE SE ARREPENDER?

Há várias passagens na Bíblia falando sobre Deus se arrepender de ter feito uma coisa ou outra. Esses textos parecem apontar para o fato de Deus não ter gostado ou ter sido surpreendido pelo resultado gerado pelos seus próprios atos e decidido mudar de rumo. Veja alguns exemplos: 
Então, se arrependeu o SENHOR de ter feito o homem na terra e isto lhe pesou no coração. Gênesis capítulo 6, versículo 6 
O Senhor arrependeu-se de ter feito Saul rei sobre Israel1 Samuel capítulo 15, versículo 35 
Esse tipo de declaração costuma gerar muita dúvida. Primeiro, porque a própria Bíblia também fala que Deus não se arrepende. Por exemplo, em Números capítulo 23, versículo 19:
"Deus não é homem, para que minta, nem filho do homem, para que se arrependa".
Logo, parece haver contradição entre esses dois tipos de declaração. 
O segundo motivo de controvérsia tem a ver com aquilo que sabemos sobre a natureza de Deus. A Bíblia ensina que Deus sabe tudo (é onisciente) e faz tudo com perfeição. Portanto, não faz sentido Deus se surpreender com qualquer coisa ou escolher um curso de ação que não vai trazer os resultados desejados. Isso é impossível, sendo Ele onisciente e perfeito.

Como, então, explicar as passagens que falam no arrependimento de Deus por algo que tenha feito?  Antes de dar uma resposta direta a essa pergunta, eu preciso esclarecer uma coisa. É quase impossível para o ser humano falar sobre Deus, simplesmente porque nossa linguagem não foi feita para descrever um Ser que é eterno, onisciente, onipotente, perfeito, etc. Não conhecemos nada remotamente parecido com Deus. 

Para você entender o que acabei de dizer, imagine que fosse pedido a uma tribo de índios não civilizados para descrever um avião. Aquelas pessoas nunca tinham visto nada nem remotamente parecido com esse tipo de máquina e são, então, colocadas diante de um grande avião. Como os índios iriam descrever o que viram?

Acho que eles só teriam uma alternativa: usar uma metáfora, comparando o avião com alguma coisa que tivesse a ver com seu dia-a-dia. Assim, provavelmente iriam dizer que um avião é como um "pássaro que solta fogo e grande como uma casa". Algo nessa linha.
É claro que essa descrição é imprecisa porque o avião não é um ser vivo, então ele tem grande diferenças em relação a um pássaro. Se os índios tiverem oportunidade de entrar no avião e procurarem por um coração ou outros órgãos encontrados nos seres, não vão encontrar.
O mesmo acontece quando falamos sobre Deus: usamos metáforas tiradas da nossa experiência de vida, pois não temos palavras suficientes para descrever a realidade. É por causa disso que falamos dos "braços" ou dos "olhos" ou ainda da "boca" de Deus. Mas, é claro que Deus não tem braços, olhos, boca e outras coisas desse tipo pois Ele é um espírito. Deus consegue ver o que fazemos, pode nos sustentar fisicamente (como se estivéssemos no seu "colo") e fala conosco, mas não tem olhos, braços ou boca, pelo menos, não no sentido que damos a essas palavras.

Usar exemplos tirados do corpo ou do comportamento humano para descrever coisas que não são humanas é um processo chamado de "antropomorfismo". Isso é muito comum, por exemplo, em desenhos animados, onde os animais falam e se comportam como nós. 

É claro que se levarmos o antropomorfismo excessivamente a sério, vamos gerar problemas. Se passarmos a acreditar que ratos e cavalos podem falar e cantar, pois vimos isso acontecer num filme, iremos ficar confusos quando virmos animais reais e eles não conseguirem fazer nada disso. E o mesmo acontece com Deus: se levarmos o antropomorfismo das descrições que fazemos de Deus a ferro e fogo, vamos gerar problemas conceituais importantes.

Quando os autores bíblicos escreveram sobre Deus se arrepender de algo, estavam usando uma experiência humana para descrever como o comportamento divino lhes pareceu ser.  Por exemplo, pareceu ser que Deus tinha arrependido de ter escolhido Saul como rei de Israel, quando aquele homem demonstrou não estar à altura da função. Isso não quer dizer que Deus se arrependeu de fato da sua escolha, porque isso não é possível, conforme a própria Bíblia ensina em outros textos. O escritor de 1 Samuel apenas descreveu o que lhe pareceu ser o desapontamento de Deus com Saul e usou a palavra "arrependimento" para expressar isso. 
Portanto, não há contradição nenhuma na Bíblia. Simplesmente, em alguns textos os autores descreveram sua percepção a respeito do comportamento de Deus e "arrependimento" foi a maneira como conseguiram explicar, em linguagem humana, aquilo que testemunharam. Já em outros textos, os autores disseram que Deus não se arrepende, sabe tudo e é perfeito, pois estavam fazendo uma reflexão teológica detalhada sobre os atributos de Deus. E descreveram corretamente alguns atributos divinos que fatalmente levam à conclusão que Deus não pode se arrepender.
Os dois tipos de textos trazem ensinamentos  de natureza diferente. Têm objetivos distintos. E, infelizmente, os autores dos dois tipos de textos usaram o mesmo verbo - "arrepender-se" - em contextos bem diferentes, gerando alguma confusão. E isso tem a ver apenas com as limitações da linguagem humana. 

Concluindo, não há possibilidade de Deus se arrepender, até porque isso não faria sentido sendo Ele onisciente e perfeito. 
Leia mais sobre esse tema aqui.

Com carinho

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

UM POUCO MAIS


O capítulo 11 do livro de Hebreus se dedica a falar dos heróis e heroínas da fé. Gente que continuou a acreditar e não perdeu sua fé, mesmo quando tudo parecia indicar que aconteceria o contrário daquilo que esperavam. E várias dessas pessoas morreram sem ter visto concretamente a realização de toda promessa que receberam. Era preciso esperar um pouco mais.

Por exemplo, esse foi o caso de Abraão, a quem Deus prometera ser o pai de uma grande nação (que viria a ser Israel). Abraão morreu deixando alguns filhos, é verdade, mas não viveu o suficiente para ver seus descendentes proliferarem a ponto de formarem uma grande nação, conforme a promessa que recebera. Mas, ele saiu da vida terrena acreditando que tinha visto sim a promessa de Deus ser cumprida. É claro que seria preciso esperar um pouco mais para que tudo se completasse, mas Abraão não se abalou com isso. Simplesmente viu com os "olhos" da fé.

Ter fé é fundamental para construir uma boa relação com Deus. Não há como seguir em frente na caminhada cristã sem ter e exercer a própria fé. E é sobre isso que falo no meu mais novo vídeo - veja aqui.

Veja outros vídeos recentes meus aqui e aqui.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

VOCÊ TAMBÉM PODE SER UM PASTOR

Você sabia que também pode ser um pastor do povo de Deus? Eu me explico. Pastor não é só um título, dado àqueles que são sacerdotes de uma determinada denominação cristã. Pastor é bem mais que isso.

Ao longo dos anos, tenho me envolvido bastante nos trabalhos sociais conduzidos pelas igrejas que tenho frequentado. E, volta e meia, pessoas das famílias que ajudamos insistem em me chamar "pastor". Preocupado em aceitar um título que não me pertence, costumava corrigi-los, mas não adianta, eles voltam a me chamar assim.

Em dado momento, dei-me conta que Jesus nunca usou a palavra "pastor" para se referir a um sacerdote. Para Ele, "pastor" é quem cuida das suas "ovelhas". Quem se importa com elas e luta para não deixar que nem uma só se perca (Lucas capítulo 15, versículos 1 a 7). Jesus é o modelo de "pastor". E veja o que Ele disse no final da sua vida (João capítulo 17, versículos 9 a 20):
É por eles [os discípulos] que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me destes por que são teus... Quando eu estava com eles, guardava-os no   teu nome que me deste, e protegi-os, e nenhum deles se perdeu, exceto o filho da perdição [Judas, que o traiu]... Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra."
Outras pessoas, além de Jesus, são também chamadas de "pastores" na Bíblia. Por exemplo, depois da sua ressurreição, Jesus apareceu para Pedro e, por três vezes, perguntou ao apóstolo se ele o amava. E quando Pedro respondeu que sim, Jesus emendou: "pastoreia as minhas ovelhas" (João capítulo 21, versículos 15 a 19). Nunca devemos nos esquecer que Pedro era um simples pescador.

É claro que, com o correr do tempo, a palavra "pastor" mais e mais foi se tornando exclusiva dos sacerdotes ordenados. E assumir esse título, para quem não é legalmente ordenado, acabou virando um certo abuso, assim como seria errado chamar de médico quem não cursou medicina.

E, por conta desse legalismo, perdeu-se um pouco do sentido original do ensinamento de Jesus. Ele ensinou que todos aqueles que o seguem podem e devem pastorear, dependendo das circunstâncias e necessidades. Até porque, se essa tarefa ficar restrita aos ministros ordenados, não haverá mão de obra suficiente para atender todas as necessidades do "rebanho" cristão, que são enormes - existem mais de 2 bilhões de cristãos no mundo.

Assim, toda vez que você cuidar de uma "ovelha", estará sendo o "pastor" dela. É claro que esse não será um título oficial seu, mas representará com fidelidade aquilo que estará fazendo naquele momento, em  obediência aos ensinamentos do próprio Jesus.

Com carinho

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

A VIDA NÃO É PERMANENTE...

Toda vez que vou a um enterro - coisa que infelizmente vai se tornando mais comum, à medida que envelheço, - sempre lembro de como a vida não é permanente. E em como as coisas podem mudar rapidamente, inclusive para pior. Vai tudo bem na vida da pessoa e aí algo de ruim acontece.

Ficamos tão envolvidos com nossas atividades e preocupações diárias que vivemos como se as coisas fossem permanentes. Como se as pessoas que amamos fossem estar sempre à nossa volta. Como se sempre fôssemos ter saúde. Como se as coisas boas nunca fossem acabar. Mas, esse é uma grande engano, pois a vida humana é transitória. Como Bíblia mesmo nos ensina: tudo passa...

Penso que essa falta de percepção é uma defesa da nossa mente para nos proteger. Um escritor conhecido disse que pensar na morte é como olhar para o sol - trata-se de coisa que só se consegue fazer por pouco tempo de cada vez. Assim, vivemos como se tudo fosse permanente, como se as pessoas e coisas fossem continuar por aqui para sempre. Mas, isso é um grande engano.

E esse engano traz, muitas vezes consequência ruins. Por exemplo, muitas vezes deixamos de demonstrar amor e apreciação pelas pessoas, pensando que sempre haverá tempo para fazer isso. E muitas vezes perdemos a oportunidade certa.  

Às vezes, temos sorte e essa oportunidade realmente aparece - por exemplo, meu pai, pouco antes de morrer, passou vários dias no hospital e eu tive oportunidade de conversar muito com ele e despedir-me de uma pessoa muito, mas muito importante para mim. 

Outras vezes, quando percebemos, já é tarde demais. Certa vez, um amigo meu me disse, com lágrimas nos olhos, que nunca tinha falado para seu pai que o amava.

Há uma história na Bíblia que lida bem com essa questão. Pedro negou Jesus por três vezes, na noite em que Ele foi preso. E, quando se deu conta, arrependeu-se amargamente do que tinha feito. Deve ter pensado que nunca mais poderia dizer para Jesus como se sentia.

Mas, para surpresa de todos, Jesus ressuscitou. E Pedro teve uma nova oportunidade. Ele estava pescando no lago da Galileia, juntamente com outros discípulos, quando Jesus apareceu na praia. Pedro foi chamado de lado para uma conversa. E Jesus lhe perguntou, por três vezes, se Pedro o amava. E o apóstolo todas as vezes respondeu que sim. E ao final de cada resposta positiva de Pedro Jesus pediu-lhe para cuidar do seu povo (João capítulo 21, versículos 15 a 17).

Se Jesus não tivesse iniciado aquela conversa, certamente Pedro não teria tido coragem para dizer ao seu Mestre que o amava e quão importante Ele era na sua vida, pois estava profundamente envergonhado e sem graça. Mas, Jesus provocou Pedro a se posicionar: a hora seria aquela e não haveria outra. E Pedro correspondeu e foi perdoado. Aquele evento mudou a vida de Pedro, permitindo-lhe recuperar a auto-estima e vir a se tornar um dos líderes da igreja cristã.

Aprenda a lição de não perder o momento certo. Pode ser para dizer a uma pessoa que a ama. Ou para tentar falar de Jesus para alguém que está perdido. Ou para ajudar alguém que precisa muito. A vida não é permanente e tudo passa. E quando a oportunidade aparece, você não pode desperdiçá-la. 

Com carinho

sábado, 1 de fevereiro de 2020

O GRITO DAS EMOÇÕES

Vamos começar uma nova série de aulas, com base no trabalho desenvolvida na classe da Escola Dominical da Catedral Metodista de São Paulo, liderada pela pastora Carol e por mim, com a participação do pastor Acadêmico Clébson. O tema é: o grito das emoções.

Emoções são como o vento: não se sabe ao certo quando vão chegar ou ir embora. Mas quando acabam, costumam deixar um monte de destroços pelo caminho. Por causa disso, em vários círculos cristãos, as emoções são desestimuladas e muitas delas rotuladas até de não espirituais.

O cristão sempre ouve que nunca deve perder o controle e precisa se arrepender de qualquer sentimento considerado negativo. Ora, não há muito como evitar ou até mesmo controlar completamente as próprias emoções. Afinal, são elas que conectam o mundo interior da pessoa com os altos e baixos da sua vida. Por exemplo, perdas geram sentimento de tristeza, raiva e até revolta. Conquistas geram sentimento de alegria, orgulho e trazem realização.

Na verdade, muitas emoções costumam ser discriminadas simplesmente porque revelam questões internas que é melhor ignorar. Assim, torna-se melhor evitar a intensidade dos próprios sentimentos, afivelando uma máscara de calma e tranquilidade, que pode até indicar indiferença. E nunca correr o risco de ver o vento das próprias emoções destelhar a “casa” da vida. 
Emoções são boas ou ruins?
A forma tradicional de discutir emoções num círculo cristão é começar qualificando-as de “boas” ou “ruins”. Emoções boas seriam alegria, amor, companheirismo, misericórdia, coragem e assim por diante. Emoções ruins seriam ódio, inveja, ciúme, egoísmo e tantas outras.
Qualificadas as emoções, o passo seguinte é aprender a desenvolver as boas emoções e procurar eliminar, ou pelo menos, conter as ruins. Mas aí vem a teoria psicanalítica e defende a tese que emoções, em si mesmas, não são nem boas nem ruins. Elas simplesmente são.

O “certo” ou “errado” estaria naquilo que a pessoa faz com suas próprias emoções. Portanto, tentar rotular previamente as emoções em boas ou ruins, acaba tornando mais difícil para a pessoa expressar honestamente seus próprios sentimentos, gerando frustrações, neuroses e outros problemas psicológicos.

A resposta da doutrina cristã é que essa linha de pensamento não leva em conta que o ser humano tem tendência para o mal. O problema básico do ser humano seria a rebelião contra Deus, seguida da tentativa de evitar as próprias responsabilidades quando peca. O ser humano seria pré-disposto a colocar outras coisas na frente de Deus (idolatria) e também procurar o caminho mais fácil para sair das situações difíceis, apelando para a mentira, a racionalização dos pecados e assim por diante.

Na visão cristã, o tratamento das emoções não pode ser feito buscando o maior conhecimento da pessoa sobre si mesma, como defende a teoria psicanalítica. Isso porque a busca por “soluções” para os problemas emocionais costuma deixar de lado a necessidade de trabalhar a relação da pessoa com Deus. E Ele se torna uma figura complementar no processo, ao invés de ser o condutor dele.
O que o “grito das emoções” pode ensinar?
Nesta série, vamos tentar trabalhar o “grito das emoções” de outro ângulo, fugindo do debate sobre emoções boas e ruins. Vamos explorar a ideia que os sentimentos, quaisquer que sejam eles, permitem à pessoa perceber como anda sua relação com Deus.
Mas é preciso antes trazer uma palavra de cautela: emoções envolvem uma interação complexa entre corpo e mente. A pessoa não sente medo ou raiva apenas na sua mente, ela sente isso também no seu corpo. Sendo assim, é perigoso achar que é possível enfrentar as lutas emocionais apenas através de uma abordagem espiritual, como propõem alguns líderes cristãos desavisados. Certas emoções, como ansiedade e depressão, envolvem forte componente físico que precisa ser tratado com medicamentos e intervenções terapêuticas.

Falar para quem estiver sofrendo fisicamente que basta se acertar com Deus que todo mal-estar irá embora, é colocar uma carga adicional sobre essa pessoa, pois ela não vai conseguir fazer isso e fatalmente irá também passar a sentir culpa.

Feita essa observação de cautela, propomos que você comece ouvindo o que suas emoções estão lhe dizendo. Comece entendendo o que elas contam sobre você mesmo/a e sobre sua inserção numa sociedade dominada pelo pecado. E, depois, use tal conhecimento para avaliar como anda sua relação com Deus, buscando entender os problemas e aprofundar essa relação.
É relativamente fácil mostrar porque as emoções de uma pessoa testemunham sobre sua relação com Deus. Por exemplo, a ansiedade costuma estar relacionada com a percepção que a vida não é previsível. A inveja costuma estar relacionada com o fato de a vida não ser justa. Já o ciúme frequentemente nasce na insegurança e, portanto, testemunha que a vida não parece ser segura.
Ora, se lembrarmos que Deus é o autor e consumador da vida (Hebreus 12:1-2), essas mesmas questões podem ser reapresentadas de outra forma: Deus é previsível? Eles é justo? Verdadeiramente gera segurança em que nele crê? Ou, melhor ainda, Deus é mesmo quem a Bíblia diz que Ele é?

Por isso o salmista (Salmo 42:11) chama você a ponderar sobre seu mundo interior:
Por que você está assim tão triste, ó minha alma? Por que está assim tão perturbada dentro de mim?
E o que você deve procurar entender? É simples: a direção do seu coração. A pergunta “o que estou sentindo?” é uma outra forma de perguntar “em que direção estou me movendo?”. Será que estou me movendo na direção de Deus ou me afastando dele?

Isso quer dizer que sentimentos bons indicam proximidade de Deus, enquanto sentimentos ruins exatamente o contrário? Seria muito bom se fosse tão simples assim, mas é preciso olhar para essa questão de forma um pouco mais criativa. A resposta certa é: emoção boa é aquela que leva você a ter maior engajamento com Deus.

Emoções consideradas por muitos como problemáticas – como a raiva e a tristeza -, muitas vezes são o caldo de cultura onde você vai reencontrar a luz e reforçar sua fé. Deus se aproxima das pessoas mais nas fraquezas e dificuldades delas. Ele se revela muito mais nos momentos escuros do que nos momentos de alegria. O famoso escritor cristão C. S. Lewis, com muita razão, observou que o sofrimento humano é o megafone da voz de Deus. Portanto, a falsa calmaria (a apatia) é um inimigo muito maior para a fé do que a emoção que parece turbulenta e difícil.

É por isso que o salmista (Salmo 77:1-10) convida que você apresente suas queixas a Deus:
Clamo a Deus por socorro; clamo a Deus que me escute. Quando estou angustiado, busco o Senhor; de noite estendo as mãos sem cessar; a minha alma está inconsolável! Lembro-me de ti, ó Deus, e suspiro; começo a meditar, e o meu espírito desfalece. Não me permites fechar os olhos; tão inquieto estou que não consigo falar. Fico a pensar nos dias que se foram, nos anos há muito passados; de noite recordo minhas canções. O meu coração medita, e o meu espírito pergunta: "Irá o Senhor rejeitar-nos para sempre? Jamais tornará a mostrar-nos o seu favor? Desapareceu para sempre o seu amor? Acabou-se a sua promessa? Esqueceu-se Deus de ser misericordioso? Em sua ira refreou sua compaixão?" Então pensei: a razão da minha dor é que a mão direita do Altíssimo não age mais.
É comum entre os cristãos o receio que assumir abertamente os próprios sentimentos perante Deus irá gerar punição severa por parte dele. Essas pessoas pensam Deus quer ordem, conformidade, filhos obedientes e bonzinhos. Mas os Salmos demonstram que Deus quer mesmo é seu envolvimento apaixonado, sua admiração e sua reverência.

O salmista convida você a questionar, duvidar e até se enraivecer com Deus. E os Salmos fornecem até as palavras necessárias para que você vocalize sua luta desesperada:
Estou exausto de tanto gemer. De tanto chorar inundo de noite a minha cama; de lágrimas encharco o meu leito. Os meus olhos se consomem de tristeza; fraquejam por causa de todos os meus adversários. Salmo 6:6-7

Em Deus nos gloriamos o tempo todo, e louvaremos o teu nome para sempre. Mas agora nos rejeitaste e nos humilhaste; já não sais com os nossos exércitos. Diante dos nossos adversários fizeste-nos bater em retirada, e os que nos odeiam nos saquearam. Tu nos entregaste para sermos devorados como ovelhas e nos dispersaste entre as nações. Vendestes o teu povo por uma ninharia, nada lucrando com a sua venda. fizeste-nos objeto de vergonha dos nossos vizinhos, de zombaria e menosprezo dos que nos rodeiam. Salmo 44:8-13

Afastastes de mim os meus melhores amigos e me tornaste repugnante para eles. Estou como um preso que não pode fugir; minhas vistas já estão fracas de tristeza. A ti, Senhor, clamo cada dia; a ti ergo as minhas mãos. Acaso mostras as tuas maravilhas aos mortos? Acaso os mortos se levantam e te louvam? Será que o teu amor é anunciado no túmulo, e a tua fidelidade, no Abismo da Morte? Será que são conhecidas as tuas maravilhas na região das trevas, e os teus feitos de justiça, na terra do esquecimento? Mas, eu, Senhor, a ti clamo por socorro; já de manhã a minha oração chega à tua presença. Por que, Senhor, me rejeitas e escondes de mim o teu rosto? Salmo 88:8-14
 Não há dúvida que parece muito mais fácil perceber a própria ligação com Deus quando você estiver lidando com emoções como amor, alegria e paz, pois tudo isso emana diretamente dele. Mas as emoções difíceis abrem uma janela importante sobre o estado da sua relação com Deus.  São elas que indicam o que Deus representa de fato para você e aquilo que você espera dele. Por isso é tão importante aprender a ouvi-las. 

Veja a agenda de aulas da nova série, com a relação completa de aulas.
  1. Introdução: Veja aqui o áudio da aula