sábado, 23 de novembro de 2019

QUANDO O MEDO AJUDA

O medo é uma das emoções mais complicadas que existem. E às vezes o medo atrapalha e, noutras vezes, ele ajuda. O medo pode paralisar, impedindo que a pessoa progrida e venha a alcançar seus sonhos. Ele pode indicar também falta fé em Deus e uma vida espiritual pobre. Mas, também pode ser um amigo, alertando do perigo e fazendo a pessoa se prevenir.
Em diversos outros textos da série sobre o medo aqui no site, falei muito sobre o lado negativo do medo. Hoje é a hora de falar do outro lado: sobre quando o medo ajuda.

Outro dia li o depoimento de uma jovem executiva que sofria nas mãos de um chefe emocionalmente abusivo. Ele espalhava o terror entre seus subordinados e parecia sentir prazer com isso. O medo e o estresse dessa moça chegaram a um nível insuportável e isso obrigou-a a agir – era uma questão de sobrevivência.  

Quando entrou na reunião decisiva, onde estavam seu chefe, o chefe dele e outras pessoas, ela estava tremendo e suando frio. As pernas bambearam. Mas, não havia alternativa. A jovem enfrentou o chefe e, para surpresa dela mesma, venceu a parada.

Depois da reunião, ela sentiu grande alívio. Foi como se um peso enorme tivesse sido tirado das suas costas. E só aí ela se deu conta que o medo a tirara da sua zona de conforto. Empurrara-a para agir. O medo fora seu amigo.
A Bíblia também tem relatos de situações assim. Por exemplo, Davi, antes de subir ao poder, foi muito perseguido pelo rei Saul, que tinha ciúme da sua popularidade entre o povo de Israel. Davi precisou fugir várias vezes e viveu uma vida errante, sem ter pouso certo. A certa altura dos acontecimentos, Davi passou a morar na cidade de Queila, em relativo conforto. Tudo parecia bem. Mas, aí se deu conta de haver perigo à vista - veja o relato de 1 Samuel 23:10-13:
Então orou: "Ó Senhor, Deus de Israel, este teu servo ouviu claramente que Saul planeja vir a Queila e destruir a cidade por causa dele. Será que os cidadãos de Queila me entregarão a ele? Saul virá de fato, conforme teu servo ouviu? Ó Senhor, Deus de Israel, responde". E o Senhor disse: "Ele virá". Davi, novamente, perguntou: "Será que os cidadãos de Queila entregarão a mim e a meus soldados a Saul? " o Senhor respondeu: "Entregarão". Então Davi e seus soldados, que eram cerca de seiscentos, partiram de Queila, e ficaram andando sem direção definida. Quando informaram a Saul que Davi tinha fugido de Queila, ele interrompeu a marcha.
Davi ficou sabendo que Saul vinha no seu encalço. E sentiu medo. Como Queila era uma cidade murada, os muros da cidade o protegeriam de um ataque de surpresa, mas também poderiam se transformar numa arapuca, impedindo-o de fugir, caso fosse necessário. Tudo iria depender, portanto, da fidelidade dos líderes da cidade para com ele.
O medo de Davi fez com que ele ficasse alerta e perguntasse a Deus sobre sua situação. Perguntou o que iria lhe acontecer, caso continuasse em Queila. E Deus respondeu que ele seria traído e entregue a Saul. Essa passagem traz um ensinamento paralelo importante – Deus não sabe somente o que vai acontecer, mas também o que poderia ter acontecido em diferentes circunstâncias (o chamado conhecimento hipotético).

A partir da revelação que Deus lhe deu, Davi saiu do seu relativo conforto e fugiu de novo, voltando à vida errante. Mas, conservou a vida.
O medo ensina
Todo sentimento forte tem algo a informar e, portanto, precisa ser escutado. No caso do medo, antes de qualquer coisa, é preciso entender que se trata de um processo provocado por reações químicas no cérebro, começando com uma descarga de adrenalina, seguida de aceleração cardíaca, tremores e suores frios. O gatilho desse processo é um estímulo físico e/ou mental, ou seja, um sinal qualquer de perigo.
Essa resposta fisiológica tem por objetivo preparar o corpo humano para fugir ou reagir às ameaças. E sem ela, não haveria como a pessoa se antecipar ao perigo. Ela continuaria agindo normalmente, sem perceber a ameaça. Nesse sentido, o medo é uma reação útil, pois ajuda a manter a integridade física e emocional da pessoa.

Fica claro, então, que o medo é inevitável e, portanto, não se trata de tentar evitá-lo, coisa impossível. Lembro que até Jesus teve medo, na noite em que foi preso, quando estava orando no jardim do Getsêmani – Ele chegou a suar sangue. A questão real é aprender a lidar com esse sentimento de forma positiva. Transformá-lo num amigo. Trata-se de conquistar o medo.
Uma boa metáfora para explicar a postura adequada diante do medo é a luz amarela de um semáforo. Trata-se de um sinal de alerta, levando o motorista a tomar cuidado. Em outras palavras, a presença do medo indica ser preciso avaliar a situação e tomar as necessárias cautelas, antes de prosseguir. O medo avisa sobre o perigo de agir de forma impulsiva, pois poderá isso poderá trazer grande arrependimento.
Agora, o medo não pode ser visto como uma luz vermelha, aquela que manda parar imediatamente e não mais seguir em frente. Considerar o medo como uma luz vermelha, sem qualquer análise mais profunda da situação, faz com que a pessoa fique paralisada e inibida, que já discutimos em outro momento (veja mais).

Outro aspecto importante do medo é que ele é bom nas doses certas e quando dirigido para o alvo correto. Quando leva você a refletir e se acautelar. E é ruim quando extrapola do razoável e/ou é focado no lugar errado. Como, então, separar o medo “bom” do medo “ruim”? De que forma diferenciar entre o medo que ajuda daquele que atrapalha? Você precisa desenvolver discernimento e há cinco coisas que ajudam muito a fazer isso:
A primeira delas é orar sempre. Pedir a Deus sabedoria e discernimento para entender a situação à sua frente, as causas do seu medo e assim por diante. Todos os grandes heróis da fé tinham na oração constante seu principal trunfo.
Segundo, aprenda a fazer seu “inventário” emocional. Isto é, passe a entender os próprios sentimentos e como eles influenciam seu comportamento. Torne-se consciente dos sinais que seu corpo emite e aprenda a decodificar essas informações. E uma coisa que ajuda muito nesse aprendizado é fazer “autópsias”, ou seja, analisar suas reações em eventos passados e as consequências delas. Tentar entender qual foi o encadeamento de pensamentos que levou você a agir de uma forma e não de outra.

A terceira delas é adquirir a capacidade de separar o “joio” do “trigo”, isto é, passar a entender claramente o que é importante em cada situação que vier a desafiar você. Isso parece simples de fazer, mas as pessoas costumam ter muita dificuldade em separar o “joio” do “trigo”, pois confundem o importante com aquilo que é acessório.
Há um exemplo disso na Bíblia que é muito bom. Certa vez Jesus estava na casa de Lázaro, Marta e Maria. E estava ensinando às pessoas presentes. Maria sentou-se aos pés de Jesus e ouvia seus ensinamentos, mas Marta ficou pela casa, atarefada com os trabalhos domésticos, e acabou se incomodando com a aparente “folga” da irmã. Veja o relato de Lucas 10:38-42):
Caminhando Jesus e os seus discípulos, chegaram a um povoado, onde certa mulher chamada Marta o recebeu em sua casa. Maria, sua irmã, ficou sentada aos pés do Senhor, ouvindo-lhe a palavra. Marta, porém, estava ocupada com muito serviço. E, aproximando-se dele, perguntou: "Senhor, não te importas que minha irmã tenha me deixado sozinha com o serviço? Dize-lhe que me ajude!" Respondeu o Senhor: "Marta! Marta! Você está preocupada e inquieta com muitas coisas; todavia apenas uma é necessária. Maria escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada".
Marta tinha boa intenção, apenas queria receber bem seu hóspede (Jesus). Mas, perdeu noção daquilo que importava verdadeiramente. Maria, sua irmã, entendeu melhor qual deveria ser sua prioridade e focou naquilo que de fato importava.
Assim como aconteceu com Marta, é comum a pessoa focar naquilo que importa pouco, mas, por algum motivo, lhe angustia. E o que importa, no caso do medo, é entender os gatilhos que levam a pessoa a reagir dessa forma, os dados da realidade à sua frente e as possíveis consequências dos seus atos. As outras importam menos.
Em quarto lugar, é preciso ter capacidade de aprender. Há pessoas que conseguem usar suas próprias experiências de vida para crescer. Já outras repetem continuamente seus passos, fazendo as mesmas escolhas repetidamente e, mesmo assim, se irritam quando colhem os mesmos resultados ruins.
José aprendeu com sua experiência. Ele era um adolescente mimado, por ser o filho preferido de Jacó. Não tinha muita sensibilidade para o ciúme que despertava nos dez irmãos mais velhos – não se importava muito com isso. Nunca se deu conta dos sinais de perigo.

Um dia os irmãos decidiram ser ver livre dele e o venderam como escravo para uma caravana que ia para o Egito. Chegando naquele país, José teve uma vida muito difícil, mas, com a ajuda de Deus, acabou progredindo e chegou a ser o primeiro-ministro do faraó. E, nesse cargo, José conseguiu salvar sua família, quando ela passou por grave crise de falta de alimentos em Canaã.
José aprendeu com seu sofrimento e mudou. Tanto assim, que perdoou os irmãos e conseguiu entender que sua trajetória cumpriu um plano divino. José entendeu que Deus tinha feito do “limão” uma “limonada” na sua vida e aprendeu com essa constatação.
Finalmente, é preciso pedir ajuda quando o medo bate às portas. E essa ajuda pode vir de mentores, pastores, terapeutas e/ou familiares. O importante é encontrar alguém que possa ajudar você a analisar suas questões de vida, de forma racional. E, inclusive, entender os eventuais desdobramentos espirituais das suas possíveis decisões.

Os homens têm muito mais dificuldade de fazer isso do que as mulheres. Eles frequentemente acham que buscar ajuda é prova de fraqueza e negam-se a dar esse passo. E com isso jogam fora um instrumento que poderia vir a ajudá-los muito.

Mulheres usam melhor esse recurso, mas, às vezes, cometem o erro oposto. Falam com gente demais, procuram conselhos em todos os lugares e acabam confusas, pois recebem sugestões contraditórias. Isso quando não dão origem a fofocas por sua incontinência verbal.

Esses cinco passos vão ajudar você a entender se o medo à sua frente é do tipo “bom” ou “ruim” e orientá-lo na melhor forma de lidar com ele. Sempre com ajuda de Deus. Amém.

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